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lte[todos os textos que escrevi (e escrevo) sobre artes visuais-imagem-etc desde 2007 estão aqui. parte deles foi publicado no Gabinete de Jerônimo]



O estranho desaparecimento de Vera Chaves Barcellos
2023

Ao analisarmos as cerca de sete décadas de sua pesquisa, chamam a atenção algumas constâncias que estão para além destas mídias. Há um movimento pendular no seu olhar entre detalhe e conjunto com o qual a artista estruturou muitos de seus trabalhos; não é à toa que um dos mais icônicos seja intitulado justamente “Atenção”, convidado o público a perceber as nuances que se movimentam de uma fotografia em preto-e-branco para uma série de desenhos. O olhar da artista se movimenta entre o fragmento arqueológico e o seu sítio, entre um olhar que divide e aquele que adiciona todas as partes.


Cômodo
2023


Em um tapete, em uma cortina, pintado diretamente sobre a parede ou em suas esculturas feitas de fragmentos de cerâmica, esse vermelhão predomina pelo espaço expositivo. A quais memórias o uso desta cor nos pode levar? Tardes de sol e churrasco? Aquele ócio após chegarmos da escola na casa de nossos pais ou avós? Banhos em piscinas de plástico? 



Espectro
2023

Todas as obras em vídeo presentes no acervo são datadas do século XXI; sua maioria é da primeira década deste século. Na edição de 1999, na X Bienal, houve prêmios dedicados à chamada “arte electrônica”, assim como nas edições de 2003, 2005 e 2007 havia o Prêmio Instituto Português da Juventude Artes Digitais. Ambas as premiações colaboraram com uma agregação de mais trabalhos desta mídia na coleção. Deste momento em diante é interessante notar como, de maneira constante, prêmios foram atribuídos a produções audiovisuais.



To each person a mountain range
2023

Between April and November 2022, the public attending the Venice Biennale could see a significant body of work by Sandra Vásquez de la Horra. Along the route of the Arsenale, the artist presented her installation entitled Las cordilleras encuentradas (The Found Mountain Ranges, 2017–2021). In the center of a room, the artist proposed an architecture similar to the schematic structure of a house. The domestic format of the installation drew attention and invited the public’s body—overstimulated by the typical biennial excesses—to enter its space and calmly wander with their eyes over the different images that make up the whole.



Desliguem a televisão
2022

Em uma das últimas mensagens que troquei por whatsapp com Sonia Andrade, ela me citou uma frase de Nietzsche: “A arte e só a arte, resta-nos a arte para não morrermos de verdade”. Na sequência ela disse: “Durante anos eu não soube dizer o que é arte até me deparar com esta citação”. Querida Sonia, peço desculpas, mas não desligaremos a televisão. Queremos te ter por perto e fazer jus à sua memória e lugar essencial para se pensar muitas narrativas vindouras sobre as artes visuais no Brasil e no mundo.


Não busque respostas em seus olhos
2022

Há uma frase presente em “VIGILANTE_EXTENDED” que parece resumir a recente, mas já experimental e ressonante trajetória da artista: “Não devemos buscar respostas em seus olhos”. Não aconselho ao público mergulhar em seu oceano de verbos no infinitivo buscando respostas imediatas e panfletárias sobre tantas questões que afligem não apenas o mundo das e-girls e e-boys. A artista parece mais interessada em fazer perguntas, provocar pequenas confusões e nos mostrar que talvez seja impossível tentarmos escapar da “Máquina”.


Who tells a tale adds a tail
2022

Working with these artists brought the opportunity to give space to names that have not yet been institutionalized—either by the market or by the museums and cultural centers—in the United States. Instead of bringing artists that regularly show their work in an explicitly—and sometimes in a folkloric—Latin American key in biennials and triennials around the globe, it seemed wiser to open the Denver Art Museum’s doors to artists who, project by project, just like little ants, keep experimenting and who are recognized by insiders.


The silence of tired tongues
2022

After so many years, I heard the song again and was intrigued by this desire for silence – indeed, why are these tongues tired? Had they talked too much? Were they exhausted from screaming in public space? Tired of disagreeing? Is this verse referring to the silence and post-orgiastic fatigue where the tongues would be exhausted, sweaty, and ecstatic? Fifty years after their release, these verses still invite many interpretations, and within the current Brazilian political landscape, they have not lost their effervescence. Being silent is also essential and can be seen both as an existential modus operandi and a political tool.



Garganta
2022

A partir dos muitos ecos interpretativos ocasionados pela figura da gárgula, esta exposição reúne artistas que trazem ao público os avessos das normas – assim como uma gárgula no espaço público de Guimarães gera, há séculos, interpretações, discussões e conhecimento. Algumas das suas pesquisas estão voltadas para a criação de figuras que se apresentam ao público como algo na fronteira entre a normatividade e a “monstruosidade”; com quantas cabeças se faz uma quimera? Quais grupos sociais e atividades humanas são associadas a atitudes desviantes e, portanto, encaradas fobicamente como monstruosas e escatológicas, levando a perseguições e ao cerceamento da liberdade?









“Efêmera”: mais do que uma semana
2021

Da nossa parte, apenas um pedido foi feito: que a participação de artistas se desse tanto por chamada aberta, quanto por convites feitos pel_s estudantes. Em certa medida – mesmo que nunca tenhamos usado o termo de forma explícita – o projeto é um laboratório de curadoria que se constitui como lugar de pesquisa e experimentação, onde _s alun_s podem escrever sobre os trabalhos apresentados, definir a programação de acordo com a circulação nos espaços da escola, ampliar a visão crítica a respeito das obras e suas interlocuções com questões atuais, bem como  vivenciar algumas das etapas da produção de uma exposição de arte, entre as quais: o contato com artistas, a montagem, a conservação e a manutenção durante a exibição, além dos registros e da desmontagem.



Dispatch: São Paulo
2021

The same organizations that at different times helped cement heterosexual White male artists at the center of notions of “Brazilian art” are now gradually trying to write new pages in their stories and attract the attention of a non-specialized public that is increasingly interested in discussing racism, the presence of women artists, and the colonial traumas that are ingrained in Brazilian society.



Como se a paixão fosse uma grande esponja molhada
2021

Seus títulos trazem algo do universo das artes performativas – “Ópera”, “Dramão”, “Draminha”, “Hamlet”, “Palco italiano” e “Coxia” compõem suas referências ao teatro. Essas palavras se transformam em personagens corporificados em mesas e outros objetos feitos para o corpo humano. Novamente com seu olhar aberto para a fantasia, esse vocabulário das artes performativas é disposto de forma fragmentária e em diálogo com a arquitetura, tal qual um balé disperso ou um ato teatral com muitos personagens que entoam suas vozes de forma dissonante.



Randolpho Lamonier in conversation with Maxwell Alexandre
2021


“I began to pick up things as metaphors. For example, the industrial aspect of the city says a lot about my personal experience there. My whole family worked in a factory, especially my mother who has done so her entire life. There is hardship in such places, which is why I immediately connected with the reality of this environment. So, I started visiting some abandoned places such as factories, railroad tracks, abandoned parks and I eventually started drifting away”.



Herança indesejada
2021


Esta equação que perpassa toda a exposição entre memória, arquivo, presente e trauma ganha um tensionamento na última sala onde, finalmente, os trabalhos de Ana Vidigal e Nuno Nunes Ferreira são colocados lado a lado. Em “1344 dias”, Nunes Ferreira faz um vídeo onde álbuns de memórias produzidas a partir do número de dias de presença do seu pai em Angola são folheados - fotografias, embalagens, tickets, recortes. O desejo fotográfico de uns – e a expressão de seu gozo capturada pela fotografia – era proporcional ao sofrimento de outros, tal qual Vidigal sutilmente propõe com um trabalho intitulado “Vidas a(r)didas” onde três quicos militares são dobrados e moldados de forma semelhante à logomarca da Adidas.



Electric dreams
2021


Poderia esse excesso de sonhos, portanto, ser interpretado como uma válvula de escape perante quinze meses de um redemoinho de sensações nunca sentidas pela grande maioria da população não apenas brasileira, mas mundial? Sonhar poderia ser enxergado como uma forma de tentarmos fazer alguma manutenção de nossa saúde mental? As artistas aqui reunidas parecem responder afirmativamente a essa questão.



Beth Jobim
2021


Pela primeira vez, Beth traz ao olhar do público uma grande série de trabalhos feitos diretamente com tecido; o material já vinha sendo experimentado em alguns objetos recentes, mas aqui os vemos em escala grande. O linho é o material escolhido e as cores, assim como em suas pinturas, tendem a um tom mais terroso e sóbrio. Essas cores compões listras e formas poligonais que apelam aos sentidos do espectador – não apenas devido aos seus contrastes inteligentes, mas pela sua materialidade. Estamos diante de pinturas que se apresentam ligeiramente moles aos nossos corpos e, como qualquer tecido, imediatamente parecem nos convidar ao toque.



Nervo
2021


Um polvo, uma língua, intestinos, uma cobra, pés, mãos, zumbis e um milho que tem não apenas um pé, mas também um olho lacrimejante: seu universo poético aponta para um desejo de dissecar corpos e apresentá-los de forma híbrida, tendendo mais para o inominável do que para o humano. Nesse sentido, a costura tem um lugar essencial na medida em que traz para os olhos do público os seus nervos, as suas linhas, as suas conexões entre materiais; a forma como a artista lida com a matéria explicita o processo artesanal que leva a esses resultados.



Mulambö todo de ouro
2021


É nesse jogo entre imagens e leituras possíveis que se movimenta o trabalho de Mulambö. Com um olhar extremamente afiado – e apenas no início de suas pesquisas e experimentações -, ele parece afirmar nessa exposição que pode estar pintado todo de ouro, mas que está longe de ser um tolo.



Sobre os ombros de gigantes
2021


A educação, a oralidade e a transmissão de conhecimento entre gerações são centrais em muitos trabalhos que valorizam pessoas anônimas do grande público, mas cujos nomes próprios podem ser muito mais importantes do que qualquer referência bibliográfica. Esses gigantes – por vezes superficialmente enxergados como periféricos e subalternizados – são aqueles que efetivamente guiam grande parcela dos artistas aqui reunidos.



Adelina Gomes
2021


Há uma sutileza no começo do filme que dialoga com a produção da artista: a primeira sequência traz Adelina andando por uma ala do hospital segurando uma bolsa. Corta-se para ela saindo pelo portão do hospital e, na próxima sequência, ela é vista colhendo flores. Por fim, antes da narração do texto de Nise, há outro corte para a artista dentro do ateliê do hospital. Adelina sai do enquadramento segurando a mesma bolsa e a câmera focaliza em uma flor – uma daquelas coletadas – dentro da sala.



so so
2020


Chama a atenção, em ambas as pesquisas, seu caráter mundano, ou seja, como os artistas lidam por muitas vezes com citações diretas a objetos banais e, a partir dali, criam séries. Um olhar rápido por essas páginas nos levará a janelas, tijolos, xícaras, biscoitos, lençóis e formas que remetem a sorvetes. Há nessa encruzilhada de trabalhos a ausência de iconoclastia; quanto mais imagens, melhor, e seu diálogo com certo fantasma da pop art é realçado pelas opções de se explorar elementos tão icônicos e massificados como os hamburgueres e os dentes de vampiro.


Nós sabemos, nós aprendemos
2020


“Véxoa: nós sabemos”, portanto, pode ser vista à contraluz desses eventos recentes. A mostra tem sua abertura conjugada com uma reconfiguração da coleção permanente da Pinacoteca – uma das maiores coleções públicas de arte do Brasil e com um lastro histórico que vai aproximadamente do século XIX à arte contemporânea.



É hora da onça beber água
2020


A pesquisa que Froiid desenvolve nos últimos anos aponta para uma constância: a noção de jogo. Se olharmos para os seus projetos realizados desde o começo dos anos 2010, percebemos que ele jogou com diferentes aspectos do sistema das artes visuais como o mercado de arte e os limites institucionais da ocupação de um espaço. Uma palavra-chave para a sua prática está contida no nome que ele deu a uma de suas séries: pastiche. Com seu olhar afiado, o artista propõe deboches aqui, ali e acolá.



Yuli Yamagata
2020


É central à sua pesquisa o ato de juntar, colar ou – como vemos em muitos de seus trabalhos – costurar; trata-se de objetos que nos levam a imaginar sua confecção desde o desenho mental até o encontro com a sua fisicalidade. Esse processo de feitura dialoga de maneira conceitual com algumas questões que a artista persegue desde seus primeiros trabalhos: a relação entre natureza e artificialidade, corpo humano e abjeção, feitura artesanal e a utilização de materiais industrializados.



Entre o Paraná e Roraima: reflexões sobre “Vaivém” no balanço de uma rede-de-dormir
2020


Além da presença destas dez redes produzidas em diferentes regiões do Brasil, foi essencial identificar suas autoras não no lugar de “artesãs”, mas de artistas visuais; toda rede de dormir não seria uma escultura? Quais circuitos de legitimação fazem com que alguns desses objetos sejam enxergados como exclusivos de colecionadores e outros vistos como massificados e, novamente naquela hierarquia, como “objetos de artesanato”?  


Negro swan
2020


Na ausência de alegorias, Tiago Sant’Ana elege poses que o levam a essa série de imagens; eis outra forma de se pensar a performatividade, dessa vez por meio da pintura. Esses sete corpos foram compostos a partir de uma colagem mental de fotografias vistas em muitas fontes e guardadas pelos printscreens dos smartphones.



Claudia Martinez Garay
2020


In her recent solo exhibition at Grimm in Amsterdam, Revolutions, like trees, are recognized by their fruits, the artist, now based in the Netherlands, showed large scale reproductions of fruits and flora from Peru (printed on free-standing shaped sheets of aluminium) in dialogue with small ceramics again in mimicry of Pre-Columbian Peruvian artifacts. These works are shown in rooms entirely painted in walls of yellow, turquoise and deep blue, an artificial environment that begs the blurs the shows intent a between document and mirage?



Black and gold
2020


“Black and gold”, portanto, é uma exposição que prossegue com a expansão do vocabulário de Élle de Bernardini como artista visual e onde uma série concisa de materiais e mídias foras eleitas: couro, ouro e ferro; escrita, objeto e instalação. Como principal material de parte dos trabalhos aqui reunidos, o couro traz em si uma proximidade inevitável com a pele humana; mole, dobrável, tensionado na parede, transformado em tela ou repousando sobre estruturas de ferro, ele pode ser visto como uma lembrança da fragilidade do próprio corpo, de seus vincos e poros.


Entrevista com Adriana Varejão
2020


“Sou uma artista que encontrou suas raízes no barroco e é interessante pensar como a arquitetura barroca lida com a ideia de interioridade. Quando você entra em um prédio barroco pode perceber que o espaço interno não se comunica com o externo ou tem qualquer relação com a fachada. É como se adentrássemos num mundo próprio, numa reprodução da atmosfera do teatro. É o oposto do que ocorre na arquitetura modernista, por exemplo, que busca a integração do espaço interno com a paisagem”.


Gustavo Caboco
2020


O olhar de Caboco é baseado em outra distância geográfica: a da sua relação com o atual estado de Roraima, com suas narrativas que envolvem seus familiares e seu pertencimento peculiar a uma identidade indígena. Filho de Lucilene, mulher Wapichana, o artista se enxerga como uma extensão entre essa origem e a cidade onde foi criado, Curitiba.


ElaineAlain’s takeover
2020


The five artists I decided to share here on ElaineAlain come from a personal curatorial interest I have on the recent months: these relations between the human body and freedom in an anti-fascist point of view. These artists – Cecilia Bengolea, Claude Cahun, Bertrand Dezoteux, Kengné Téguia and Raphael Zarka - develop researches that deal with the body as triggers for reflections about resistance. These uses of the body have a range of media: some of them are central in performative ephemeral acts, while others are depicted through video, digital animation and photography.


Wanda Pimentel (in memoriam)
2019


Quando observamos as icônicas obras de sua primeira década de produção, nosso olhar é convidado a se surpreender com os detalhes trazidos pela artista. Na sua primeira grande série de trabalhos, “Envolvimento”, produzidos em sua maioria entre 1968 e 1969, ambientes coloridos construídos geometricamente com o uso da cor são ocupados por fragmentos de corpos femininos – um quarto, um carro, uma cozinha, um banheiro? Suspeitamos esses serem alguns de seus lugares, mas a sua representação nunca se dá de maneira objetiva e explícita.


Canseira
2019


O terceiro e último aspecto que chama a atenção na exposição de Sofia Caesar vai ao encontro da imagem citada no começo desse texto – a representação do corpo fatigado através do uso da fotografia e do vídeo. “Workation” é uma instalação dividida em quatro telas pretas que crescem proporcionalmente: um smartphone, um laptop e dois monitores de LCD de tamanhos diferentes. O corpo da artista está presente em todos os vídeos e está associado a um objeto de repouso ou trabalho – a cadeira de praia, a rede de dormir, a mesa de escritório e os papéis jogados para o ar.



Em colaboração com o sol
2019


Esse trabalho de Navarro denota seu constante interesse pela criação de ficções a partir de uma observação de fenômenos da natureza que geralmente vem de uma perspectiva científica. Os astros, os animais, o som e as medições anatômicas são apenas alguns dos aspectos de uma poética com pitadas de um futurismo que intriga o espectador. Somos convidados a adentrar um universo que se apresenta por meio de ações coordenadas pelo artista. O tempo se faz essencial para não apenas observar, mas sermos também parte de suas propostas.



Vaivém
2019


Assim como a rede envolve o corpo, o objeto e suas representações iconográficas acolheram discursos com intenções não raramente contraditórias. Longe de reforçar os estereótipos da tropicalidade, esta exposição investiga suas origens: ao revisitar o passado, conseguimos compreender como um fazer ancestral criado pelos povos ameríndios foi apropriado pelos europeus e, mais de cinco séculos após a invasão das Américas, ocupa um lugar de destaque no panteão que constitui a noção de uma identidade brasileira.


Canastra da Emília
2019


A experimentação com a cor pela utilização de diversos tecidos chama a atenção do espectador - nesses detalhes poderíamos nos deter por horas. Mesmo nos trabalhos cuja base tem um formato mais próximo do polígono, o artista confecciona uma sucessão de tecidos que nos retira da planaridade e nos joga para o espaço. Chegamos a um elemento central da produção de Arthur Chaves: o apelo ao corpo humano.


O prazer é nosso
2019


Essa exposição vai ao encontro do programa curatorial do MAC Niterói e seu interesse pela equação entre lazer, prazer e artes visuais. Essas questões eram latentes nas últimas duas exposições apresentadas no salão central – “Riposatevi”, de Lucio Costa e “Tempo aberto”, de Federico Herrero. A prática do OPAVIVARÁ! dá prosseguimento a essas reflexões e nos permite que relacionemos suas atividades com outros coletivos na América Latina e em outras áreas do mundo. A união certamente faz a força.


Sunday
2019


Em entrevista realizada em 2017, Dan Coopey conversa com Fernanda Brenner a respeito de seus trabalhos recentes e admite a importância da passagem do tempo em sua produção: “Eu fico muito impaciente para ver meus trabalhos no período de dez anos, pois sou muito consciente sobre como o vime que uso envelhecerá e sua cor se aprofundará com o tempo”. Gosto de refletir sobre a pesquisa do artista a partir dessa equação entre a materialidade e o peso do tempo.


Coisas
2019


Esse é um dos momentos onde entendemos claramente como estes “objetos” – palavra que nos levaria a seu caráter utilitário - se transformam em “coisas”: algo que foi deslocado de sua concepção inicial e jogado na esfera da dúvida e do exercício imaginativo por parte do público. Esta é a esfera da arte e é nela que, sob a batuta de Regina Silveira, somos instigados constantemente.


Sonia Andrade
2019


Ao caminharmos por esse arquipélago de contas, um elemento causava surpresa: a partir das contas de uma pessoa, Sonia Andrade, era possível fazer um verdadeiro inventário das histórias do Brasil. Algumas contas traziam frases elogiosas à ditadura militar, ao passo que outras dos anos 1990 tinham uma campanha contra os incêndios na Amazônia – o que permanece e o que foi esquecido nesse arco temporal?


Liberdade
2019


Como em tudo relacionado à sua pesquisa, não nos iludamos com a aparição dessas palavras – seu uso não é ingênuo e todas elas são pensadas milimetricamente. Não à toa, apenas como exemplo, o seu quadro que proclama “liberdade” tem a sua escrita em diversas orientações – conseguimos lê-lo, mas essa forma de escrever pode ser uma metáfora provocativa para a impossibilidade de conseguirmos ser livres.


Coisas, anticaixas e não-objetos
2019


Tanto em uma imagem, quanto na outra, os objetos fotografados são obras de Solange Escosteguy. O segundo exemplo se trata de um dos poucos registros dos seus trabalhos mostrados na célebre exposição da “Nova objetividade brasileira”, realizada em 1967, no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro – uma das mais importantes exposições do período e referência para os estudos da produção de arte no Brasil durante o período da ditadura militar. A outra imagem é um retrato da artista em sua primeira casa-ateliê no bairro de Santa Teresa, no Rio de Janeiro, entre 1964 e 1965.



Abdias Nascimento: um espírito libertador
2019


Essa exposição partilha dessa perspectiva proposta por Abdias Nascimento e traz ao público do MAC Niterói um aspecto de seu próprio “espírito libertador”. Professor, político, ator e teatrólogo, Abdias é um dos nomes mais importantes para o estabelecimento do movimento negro no Brasil e no mundo. Como uma das diversas atividades que compunham sua personalidade inquieta, essa mostra chama a atenção para a sua produção como pintor e designer. Ocupando as cinco paredes do salão central, são visíveis tanto os interesses variados do artista no que diz respeito aos temas pintados, quanto também uma constância relativa às suas opções formais.


Farol
2019


Nos últimos anos, Engel Leonardo tem estudado o projeto de Flávio de Carvalho de maneira minuciosa. Alguns detalhes propostos para o monumento chamaram a sua atenção: dos contornos das portas até detalhes relativos aos azulejos, grades e papéis de parede. A experimentação de Carvalho se transformou em diretriz para novas peças de Leonardo que citam o projeto e ao mesmo tempo trazem ao presente imagens longe das pretensões futuristas originais.


Trabalhar cansa
2019


Estas fotografias de Arçari são uma espécie de decupagem do ambiente de trabalho cafeeiro. São fragmentos de atividades que se repetem diariamente e que são regidas não apenas pelo desejo humano, mas pelos próprios limites oferecidos pela natureza. Algo semelhante pode ser percebido nos seus vídeos também apresentados. “Terra dura” (2017) traz um olhar dirigido para o campo e tem sua estrutura narrativa pautada na leitura de trechos de poemas de Cesare Pavese.


O país ocupado
2019


Optamos por reunir em formato de quatro pequenas exposições individuais obras de artistas que tem uma presença considerável tanto quantitativamente, quanto de maneira qualitativa na coleção. Os quatro artistas aqui reunidos – Antonio Dias, Antonio Manuel, Ivan Serpa e Rubens Gerchman – tiveram carreiras que se estenderam por muitas décadas. Todos eles foram extremamente ativos e cada um respondeu à sua maneira às violentas décadas de 1960 e 1970 no Brasil.


Entrevista com Élle de Bernardini
2019


“Eu não queria parecer que não era bárbara também – somos todos bárbaros, eu não me excluo disso. No teatro, quando a gente quer representar o estereótipo de uma mulher louca, ela está sempre descabelada. Então entrei assim, descalça, com uma roupa preta e os olhos pintados de vermelho. Achava que o fato de gritar no meio da praça, em frente ao gabinete do prefeito, já me fazia bárbara”.


Tramas de contradição
2019


Devido a essa extensa história, a rede balança entre a ancestralidade e a contemporaneidade – o objeto foi e é associado aos mais diversos lugares, culturas e estratos sociais. Ela pode ser o assento da pessoa julgada como preguiçosa – que possivelmente não vem do mesmo lugar do indivíduo que emite o discurso; a rede pode também ser vista simplesmente como um objeto tridimensional dotado de potência escultórica sem necessariamente estar imbuída de um discurso identitário.


Tempo aberto
2019


No centro da sala, uma série de objetos é instalado e convida o público a sair de seu lugar de contemplação frontal das paredes. Inspirados nos mobiliários tanto das salas dos museus como aqueles encontrados nas praias ao redor do MAC Niterói, essas peças pedem que os visitantes as ocupem com seus corpos. Essa proposição de Herrero nos faz lembrar que tudo no campo das artes visuais parte do corpo e é destinado também a ele – mesmo a visão de sua intervenção nos murais do museu são um convite ao deslocamento de cada um de nós e serão vivenciadas de maneira específica de acordo com a maneira como lidamos com nossos próprios corpos.


Entrevista com Solange Escosteguy
2019


“Em 1964 tinha 19 anos, em 2019 completo 74 anos. Amadurecimento conta e a visão do passado também. O que não mudou: sou uma operária da arte, acredito mais na transpiração do que na inspiração. Mergulho fundo sempre que me programo para uma exposição - ou seja lá o projeto que esteja desenvolvendo. No começo foi a ruptura dos espaços – era um não à pintura de cavalete e uma procura por formas alternativas para o trabalho e para onde mostrá-lo. Esse processo deu origem às anti-caixas e aos vestidos, verdadeiras esculturas vivas”.


Desaguar no Rio Sururu
2019

O primeiro reconhecimento institucional de Marepe vem com sua participação e premiação na I Bienal do Recôncavo, em São Félix, Bahia, em 1991. A obra que o artista cita acima, Jogo precoce, é figurativa, de concreto e traz a representação de um menino negro sentado sobre um escovão. Forrado com cartelas de bingo, o escovão traz ainda a figura de um rato e as cores de uma colcha de retalho.



Jhafis Quintero
2019

La relación entre el cuerpo humano y la idea de encarcelamiento es, de cierta manera, una de las fuerzas motoras de la investigación de Jhafis Quintero. Con una carrera de dos décadas, su trabajo se desarrolla a partir de diversos medios que observan las muchas prisiones por las cuales la existencia humana puede pasar. Una de ellas, inevitablemente, es la del propio cuerpo - el pedazo de carne, huesos y órganos en que nacemos es nuestra mayor prisión y con él tenemos que convivir diariamente.


O lugar a que se volta é sempre outro
2019


A sugestão de narrativas pelo sequenciamento de imagens é algo que se faz presente em outros dos trabalhos aqui mostrados e que possuem um apelo mais artesanal. Em “Sob os céus”, a artista recortou fotografias produzidas na Europa durante os anos 1979 e 1984 onde a presença do céu era notável. A partir desse material, mosaicos de céus foram criados e podem ser vistos como um inventário de cores, temperaturas e desenhos – coladas uma ao lado da outra, essas fotografias parecem compor um calendário e podem se aproximar da noção de um diário: coleções de céus, coleções de dias e noites.


Edilson Parra
2019


A resposta cabe a cada um, mas parece que a exposição sugere um encaminhamento para a questão a partir de um de seus trabalhos: “Luto”, diz em letras garrafais uma gigante faixa. A palavra pode se referir tanto ao verbo, quanto ao substantivo. A resposta de Edilson Parra parece mais voltada à ação – esse ato de lutar no campo das artes visuais pode se dar tanto pela literalidade, quanto pelo mistério das imagens. O artista parece escolher, felizmente, ambas as vias, cada uma em seu tempo.


Inventário verde da Boa Esperança
2019

“Inventário verde da Boa Esperança” é a maior série fotográfica já realizada por Maurício Pokémon. A relação entre espaço e imagem é indicada desde o seu título; trata-se de uma sequência produzida em torno da Avenida da Boa Esperança, na Zona Norte de Teresina. Uma área que no passado colonial era habitada pelo povo indígena Poti, desde meados do século passado começou a ser habitada por pessoas que se tornaram em sua maioria pequenos agricultores. O sonho da casa própria foi concretizado por muitas dessas famílias.


Eco eco eco
2019


Augusto Fonseca recodifica essa narrativa greco-romana em sua mais recente exposição individual. Seu interesse é indicado não apenas pelo título “Tudo é eco no universo”, mas especialmente pela série nova de trabalhos chamada de “Homo narcissus”. Seu Narciso, porém, foi dissecado por suas mãos e está pronto para os olhos do público; seu nome surge em latim e adota o formato típico das espécies científicas. Eis o seu “homem narcísico”.


Liminaridade
2019


Os limites entre materiais e também aqueles relativos à escultura e o seu entorno são alguns dos interesses centrais na nova série de trabalhos de Frida Baranek. Essa equação entre matéria e espaço é inerente à escultura em sua perspectiva histórica; da Antiguidade à efemeridade das instalações realizadas nos últimos cinquenta anos, mostrar um objeto artístico tridimensional sempre se configura como um tensionamento entre escalas, cores e materialidades.



Lost and found: imagining new worlds
2019


These questions were the driving forces of Lost and found: imagining new worlds. As the title of the exhibition suggests, I believe that all collected objects give rise to a kind of Pandora’s box of complications, and at the same time they are vulnerable to the human effort of rationalisation, division, inventory and classification. Ten artists have contributed to the exhibition and the works shown here explore ideas of collecting and collections in different ways.


Um sorriso no canto da boca
2019

Se em outros projetos Rui Macedo interveio em andares inteiros dos edifícios das instituições, criando uma uniformidade expográfica, no MNAC suas ações se dão de maneira mais cirúrgica e discreta. Caberá ao público estar atento e notar que algumas das pinturas que estão à mostra talvez não façam parte nem da coleção, nem do pensamento curatorial que regeu o projeto.


The sun teaches us that history is not everything
2018


What drives this discourse and all those contained in the introduction is a strong nationalism anchored in political stances already seen in totalitarian political systems. It is difficult not to remember some publications in the field of historical studies that analyse other moments in which the semantic field of words like migration, borders, nation, invasion, escape, refuge and identity were discursively triggered for the same purpose. I refer to the book by Benedict Anderson, "Imagined Communities" (1983), a key text on the analysis of mechanisms for the creation of new nationalisms.


Riposatevi
2018

Como ele disse em texto da época, “O tempo livre em termos brasileiros pode ter como símbolo a rede e o violão”. Havia apenas quatro anos de que Brasília, a cidade desenhada por Costa, havia sido inaugurada e atraído a atenção de arquitetos e intelectuais de todo o mundo. Em “Riposatevi”, portanto, ele pretendia lançar luz tanto para o seu feito recente, quanto responder à proposição curatorial. O espaço era tomado por registros fotográficos feitos por Marcel Gautherot - o fotógrafo oficial do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – de vistas da praia de Aquiraz, no Ceará e também de vistas tomadas durante a construção de Brasília.


Vamos de mãos dadas
2018


Tomando esses versos não só como metáfora, mas também como estratégia, o Panapaná 2018 propôs o diálogo e a convivência de doze artistas da região Nordeste como possibilidade de investigação e criação artística contemporânea. Depois de cerca de um mês de diálogos à distância, foi realizada um semana de convivência entre artistas como um modo de aproximar os universos de criação e possibilitar um intercâmbio regional tendo João Pessoa como sede dessas discussões durante a exposição. Nessa semana, foram apresentadas questões de interesse central nas produções artísticas das pessoas participantes e, mais que isso, foi um momento de colaboração e intercâmbios estéticos.


Um corpo no ar pronto pra fazer barulho
2018


Como em qualquer salto ornamental, por mais que se treine excessivamente, nada é capaz de prever o splash final. O mesmo pode ser dito a respeito das pesquisas em artes visuais; interesses afins podem levar a resultados muito diferentes e, longe de buscar um “sucesso”, todos aqui anseiam por pensar e experimentar. Cada artista que participou desse processo foi especialmente convidado a apresentar mais de um trabalho na exposição final. Se a experimentação era a nossa força-motora, porque também não encarar esse mostra como a possibilidade de, perante o público, ocupar cada canto da Galeria D. J. Oliveira?



Televisão
2018


É feito o convite para que o público do museu percorra o mezanino e as diferentes tele-visões propostas por Luiz Roque. Cada uma dessas sequências apontará uma diferente expectativa quanto ao futuro – não apenas das narrativas criadas pelo artista, mas também quanto à nossa própria existência. Só o tempo responderá.



É tarde e chove, mas os ratos não tem medo do escuro
2018

Não à toa, um dos mais extensos trabalhos dessa mostra é a série intitulada “Crônicas de retalhos”. Usando tapetes de chão e pedaços de tecido, o artista costura cenas, personagens e frases que indicam narrativas. Esses objetos de aparência bruta chamam a atenção por concentrar representações da violência e um fazer artesanal. Há certa delicadeza na maneira como o artista compõe as linhas que dão a forma de um revólver, mas a tragédia da representação de uma arma também se encontra sobreposta a esses detalhes. São retalhos de vidas, por si só, já retalhadas – o corpo assassinado, o corpo que volta e se vinga de seus traumas, o grito que é calado no espaço público.


Complejo como un cardumen
2018

El color sigue esencial en su trabajo y, según Neto también afirma en la entrevista para ese catálogo, el azul fue su punto de partida para "Um dia fomos todos peixes" - en referencia al océano y también al nombre de la Blueproject Foundation. Al observar la instalación, veremos que hay diferentes tonos de azul, verde y presencias puntuales de naranja que contrastan con la frialdad de la sala expositiva que, con su color gris y columnas de hierro, trae una arquitectura que perpetúa algo de industrial.


Tunga
2018

Esse interesse pelas sutilezas nos ajuda a compreender tanto a presença essencial dos desenhos na exposição, quanto o próprio discurso curatorial a respeito deles. Por mais que a mostra tenha sido anunciada como uma exposição que gire em torno dos desenhos feitos por Tunga – seja enquanto projetos para esculturas, seja enquanto experimentação gráfica – ao caminhar pelas duas salas se percebia a presença de diferentes linguagens e escalas.


Meu mundo é hoje
2018

Ao observamos imagens das exposições às quais Sonia Gomes participou, a maior parte das espacializações de sua obra se dá de forma semelhante e levam o nosso olhar a fruir sua produção como obras abstratas que parecem possuir um interesse formal; o que é trabalho físico e concentração pode ser interpretado como um convite exclusivo à busca pela beleza plástica. O que dentro de sua casa poderia ser enxergado como um site specific, nesse trânsito entre espaços é transformado em objeto.


Atlântico e Mediterrâneo
2018

Como o tempo verbal dessa frase, a pesquisa de Leila Danziger versa sobre o presente dessas imagens, ou seja, fatos edocumentos históricos são recodificados como destroços que seguem agindo no mundo contemporâneo. Se o Holocausto chegou ao fim, o antissemitismo não – e basta pesquisar suas estatísticas ainda latentes em um momento histórico em queo ódio impulsiona tantas ações.


Brinquedo de furar moletom
2018

As histórias do colonialismo na América Latina e seus reflexos traumáticos na contemporaneidade são um dos núcleos de interesse de Jaime Lauriano. Nascido e baseado na cidade de São Paulo, o artista tem desenvolvido diferentes trabalhos em que seu olhar crítico se volta para as narrativas da violência no Brasil, em especial no que diz respeito à população negra em um arco temporal que vai do tráfico negreiro à resistência atual das comunidades quilombolas.


A vida renasce, sempre
2018

A trajetória de Sonia Gomes como artista visual está centrada na noção de recomeço. Atualmente baseada em São Paulo, a sua obra lida com a experimentação e apropriação de materiais que anteriormente poderiam ser vistos como pouco importantes. Nas suas mãos, porém, eles se transformam na superfície e estrutura de objetos de formas orgânicas que brotam da mesa e paredes de sua casa-ateliê e, posteriormente, ocupam as diferentes arquiteturas de museus e galerias.



Encontro vendado
2018


Comum à sua prática fotográfica e a algumas instalações é a relação entre as imagens e a escrita; Chaves tem especial interesse em jogar com palavras. Com a ajuda de um espelho, a palavra “tuo” pode se transformar em “out”, assim como a frase “Come into the hole”, com o auxílio da letra W, se torna “Come into the whole”. É essa busca pela dubiedade dos sentidos que o leva ao que talvez seja o seu trabalho mais conhecido no Brasil - a frase “Eu só vendo a vista” inserida sobre um cartão postal fotográfico do Pão de Açúcar.


Copydesk
2018

Na primeira vez em que estive no ateliê de Eloá Carvalho, em 2014, uma frase me chamou a atenção. Conversando sobre a sua pesquisa com a pintura, questionei se ela se intitulava “pintora”. Sua resposta foi “Eu trabalho também com pintura” – ou seja, a técnica se trata de um de seus interesses dentre outros. Após estar ao seu lado durante o processo que culminou nessa exposição individual, sua afirmação ecoava em nossas conversas.



Ao sul do futuro
2018

Em 1941, o escritor austríaco Stefan Zweig publicou o livro “Brasil, país do futuro”. O texto reflete o encantamento com os trópicos durante seu período de exílio devido à Segunda Guerra Mundial. Alguns anos antes da publicação do livro, em 1935, a família Danziger chegava ao Rio de Janeiro também em refúgio devido ao antissemitismo nazista. Uma década antes, em 1923, o artista Lasar Segall fixa residência em São Paulo.


Água parada
2018

As palavras que compõem o título da exposição de Vivian Caccuri – “Água parada” – possivelmente ecoarão no público uma das maiores preocupações da saúde pública no Brasil: a dengue. Ao pensarmos nessa doença tropical, é inevitável que uma imagem venha à nossa mente: a temerosa figura do mosquito que a transmite.


Senhor dos caminhos
2018

A pesquisa de Ayrson Heráclito no campo das artes visuais se desenvolve há mais de três décadas. Baseado em Salvador, na Bahia, não é exagero dizer que o artista é um dos pioneiros na investigação das relações entre as culturas afro-brasileiras e a criação de imagens na contemporaneidade. 



Cimento manchado de batom
2018


Há três elementos que chamam a atenção em seu percurso devido à constância de suas aparições; desde uma de suas primeiras séries, “Desenho de arquitetura” (2004), esses aspectos estão presentes: a apropriação de materiais industriais (e não associados à prática artística); o lugar protagonista da cor; e a relação pensada entre a escala dos trabalhos e o corpo humano. Realizados no tamanho de dois por dois metros, as peças desta série foram produzidas com esmalte sintético sobre lona plástica e, não à toa, a série foi desenvolvida e dividida nas cores azul e laranja.



O corte e os recortes
2018

As relações entre a fotografia e a paisagem parecem ser um dos interesses centrais da pesquisa de Julia Kater. Quando observamos seus trabalhos realizados desde 2011, a linguagem fotográfica aparece de forma insistente com um olhar que registra ambientes abertos nos quais a água é muitas vezes predominante.


De fuera hacía adentro
2018

Los trabajos recientes de Esvin Alarcón Lam - que tuve el placer de acompañar durante una corta temporada por Guatemala - apuntan a otros deseos en su investigación. Una mirada atenta, sin embargo, percibirá elementos comunes entre eses resultados y sus experiencias anteriores.



Molt bé!
2018


Já se tornou uma tradição: após a participação da Portas Vilaseca Galeria em feiras de arte, uma foto é feita do espaço em desmontagem e se lê a frase catalã “Molt bé!” escrita. Em algumas oportunidades se escreve usando uma caneta, enquanto em outros eventos se utiliza fita adesiva – o importante é afirmar esse “muito bem!” e estar preparado para a próxima vez. Para além da celebração, a opção por escrever em catalão não é um detalhe; ela é uma maneira de não esquecer das histórias de recomeço da sua família paterna que imigrou de Barcelona para o Brasil há muitas décadas.



33 quilômetros
2018


Ao deixar o espaço e me encaminhar novamente para o metrô, fiquei a me perguntar: será que o público frequentador do Jockey Clube iria até a Phábrika ver essa mesma programação? E se houvesse a mesmíssima programação com Ayrson Heráclito em Fazenda Botafogo – um artista que certamente aceitaria o convite –, será que iria? Trabalhando há mais de um ano no MAC Niterói e presenciando a invisível dificuldade que muitas pessoas tem em cruzar a ponte Rio-Niterói, respondi a mim mesmo que não, a grande maioria do público de artes visuais não iria até a Phábrika.


Anna Bella & Lygia & Mira & Wanda
2018

Tendo em vista que a arquitetura do mezanino tem seções bem definidas, decidimos ocupar cada uma delas de maneira a sugerir pequenas exposições individuais. Optamos, nesse momento, por prestar uma homenagem a quatro das mais importantes artistas visuais ativas no Brasil entre meados do século XX e a contemporaneidade: Anna Bella Geiger, Lygia Clark, Mira Schendel e Wanda Pimentel. 


Enredos para um corpo
2018

Paulo da Mata e Tales Frey desenvolvem suas pesquisas em parceria há cerca de uma década. Mais do que cocriadores, os dois também são parceiros no campo dos afetos e possuem uma relação em que amor e trabalho se conectam. Desse encontro nasce a Cia. Excessos e essa mistura possibilita a experimentação entre as artes visuais e performativas.



Laura Aguilar
2018


Uma das mais impactantes era, certamente, a retrospectiva de Laura Aguilar realizada no Vincent Price Art Museum, em East Los Angeles – região extremamente interessante por ser aquela com maior concentração de latinos em Los Angeles. Aguilar também tem ascendência latino-americana; mais precisamente mexicana, o que faz com que sua identidade e sua produção artística muitas vezes seja chamada de “chicana”.  



Axé Bahia: the power of art in an Afro-Brazilian metropolis
2018

No decorrer de sua história, o espaço inicialmente visto como museu de antropologia e etnografia ampliou o seu escopo curatorial e passou também a abrigar exposições de artistas visuais contemporâneos advindos da América Latina, África, Ásia e Oceania, além de organizar exposições coletivas que friccionam obras com diferentes estatutos e geografias. A referida exposição, portanto, responde a esta história recente do Fowler Museum.


Anna Maria Maiolino
2018


Ocupando as salas do museu dedicadas às exposições temporárias, a mostra chamava a atenção inicialmente pelo seu título: “Anna Maria Maiolino”. Não se fez necessário, nessa opção tomada pelos curadores Helen Molesworth e Bryan Barcena, dar um subtítulo para tentar circunscrever a produção da artista – algo visto em muitas das outras exposições individuais organizadas para essa mesma temporada de projetos.



Miradouro
2018

Ao se estudar a pesquisa de mais de três décadas de Suzana Queiroga, talvez a linguagem que pareça mais explorada seja a pintura. Mais do que isso, tenho a impressão de que poderíamos discorrer de maneira extensa sobre a habilidade da artista em estudar as variações cromáticas a partir de sua produção. 



Dorminhocos
2018


As respostas variam de acordo com as imagens, mas o fato de que é possível fazer tantas perguntas é diretamente proporcional à sua potência. Os tons de preto e branco constantes na fotografia de Verger criam uma ambiência em que o trabalho é contemplado como uma atividade permeada de melancolia e distante de qualquer discurso edificante. Trabalhar cansa, e uma rotina instaurada por esse valor capitalista e moderno, segundo seu olhar, não parece fazer sentido.



Entre falas
2018

A produção recente de Adriana Aranha parece apontar para dois caminhos – um do qual o público já é conhecedor e outro que, pouco a pouco, vem ganhando espaço em sua pesquisa. O primeiro ao qual me refiro diz respeito ao seu enfoque por gestos banais e reconhecidos pelo espectador devido ao seu caráter utilitário: caminhar por uma calçada, observar o dia-a-dia de um prédio, jogar bingo, rabiscar – estes são alguns dos verbos que compuseram a rotina da artista e que se recodificaram em visualidades.


Don’t you (forget about me)
2017


Rafael Alonso possui uma pesquisa de mais de dez anos como artista visual e explora especificamente a pintura e a cor. Nascido e criado em Niterói, seu trabalho dialoga com diferentes tradições do que se convencionou chamar de “pintura abstrata”. Além de experimentar diversas maneiras de abordar a planaridade da pintura e sua relação com o corpo humano – chegando mesmo a obras tridimensionais e à apropriação de objetos utilitários que recebem cores -, o artista também utiliza diferentes recortes e materiais para aplicar faixas de cor que nos últimos anos saltam aos olhos devido ao seu alto contraste.



Versão oficial
2017

A tensão entre presente e o passado é um dos interesses centrais do artista Bruno Faria. Nascido em Recife e vivendo em São Paulo, o seu trabalho cria novas narrativas a partir de documentos, de fatos históricos e da apropriação de objetos. O site specific – ou seja, a produção de obras que respondem a contextos arquitetônicos ou exposições específicas – costuma ser o seu campo de experimentação.



Oxalá que dê bom tempo
2017


Esta exposição é uma celebração aos mais de cinquenta anos de percurso da artista visual Regina Vater. Nascida no Rio de Janeiro, ela pôde viver por curtos períodos - devido a prêmios e bolsas – em lugares tão diferentes como São Paulo, Nova Iorque, Paris e a cidade de Austin, capital do estado norte-americano do Texas, onde residiu a partir de 1986. Em 2012, ao lar retornou e, desde então vive na Região dos Lagos.



Coleção MAC Niterói: arte contemporânea no Brasil

2017

Comemorando os 21 anos do MAC e a chegada de uma nova direção, a presente exposição reúne obras da coleção do MAC – muitas delas nunca foram expostas antes no museu. O MAC é reconhecido por ter em comodato a coleção Sattamini, mas ao longo de sua história também formou sua própria coleção, constituída por quase 600 obras, a maioria delas doada pelos próprios artistas. Nesse sentido, essa exposição foi pensada a partir de uma pequena intervenção curatorial que, mesmo que crie uma narrativa histórica, pretende mais compartilhar com o público parte significativa dessa importante coleção de arte contemporânea no Brasil.



Eu só vendo a vista
2017


Com esse interesse em mente, convidamos o artista carioca Marcos Chaves para realizar a primeira dessa série de intervenções nesse sinuoso espaço. Com uma carreira de quase três décadas, sua pesquisa como artista visual se dá por mídias tão diferentes como a fotografia, a escultura, o vídeo e a instalação. Constante à sua produção, porém, há o interesse pela relação entre imagem e texto, geralmente através de uma ótica emque o humor é bem-vindo.



Entrevista com Carlos Vergara
2017


“As grades são figuração. Porque são diagonais e é uma medição de um espaço, com a tensão que eu posso colocar naquele espaço. Eu fiz coisas muito grandes, coisas pequenas, a lápis. Na verdade, é uma medição emocional de um espaço. Como é que eu posso tornar esse espaço imantado para o olho através do uso da cor? Tem essa coisa do Borges que eu gosto de contar. Eu fui numa última palestra do Borges, ele estava sentado numa mesinha”.



Dura lex sed lex
2017


Dura lex sed lex es una expresión extraída del latín que significa “la ley es dura, pero es la ley”. La máxima era utilizada en Roma antigua para recordar los límites de la legislación estatal y su sentido intrínseco de inflexibilidad. En otras palabras, podríamos decir que si la ley no fuese dura, simplemente no sería ley y que su rigidez sirve al control de la mayoría por una minoría de dirigentes. En los últimos tiempos, especialmente, la legitimidad de las acciones judiciales y políticas ha sido cuestionada por el aparente grado de arbitrariedad de sus procedimientos.


Antonio Pichillá
2017


Em viagem recente para a Guatemala, tive o prazer de ver a exposição do artista guatemalteco Antonio Pichillá na recém-aberta Galeria Extra. O espaço de tamanho modesto faz coro a outras galerias da Ciudad de Guatemala dedicados à arte contemporânea – como Proyectos Ultravioleta, The 9.99 e Sol del Río. O desejo de compartilhar com o público a produção de artistas vivos – assim como qualquer iniciativa semelhante em território latino-americano – é certamente bem-vindo.



A pintura pop de Chéri Samba: além da mágica da terra
2017


Creio que todas essas questões refletidas aqui até agora permeiem uma obra do artista congolense Chéri Samba. Intitulada “Quel avenir pour notre art?” (“Qual o futuro de nossa arte?”), esta foi exposta na XXV Bienal de São Paulo, sob a curadoria de Alfons Hug, que propunha como recorte temático as “Iconografias metropolitanas”, ou seja, artistas que problematizassem suas megalópoles e lidassem com problemas, no campo da cultura, entre espaço e arte.



Antonio Manuel

2017

A exposição de Antonio Manuel na Galeria Cássia Bomeny, no Rio de Janeiro, pode ser vista – inevitavelmente – como uma celebração: tanto de seu aniversário de setenta anos, quanto de seus cerca de cinquenta anos de percurso como artista visual. É indiscutível o seu lugar ímpar na história da arte contemporânea no Brasil e seu caráter experimental desde meados dos anos 1960. Ao se estudar a geração de artistas ativos durante a ditadura militar no país, é essencial olharmos tanto suas pinturas em diálogo com a diagramação de jornais, quanto também sua apropriação de flans de impressão. 



A arte da memória
2017


Tenho a impressão de que as imagens estudas por Yates para se pensar esse grande mistério que é a memória são um farol para essa situação de diálogo estabelecida com Carlos Vergara. Como ele disse em entrevista, se trata de um artista que não descansou em seus mais de cinquenta anos de carreira e que segue produzindo diariamente. Ao olhar para suas obras temos também um edifício – um museu imaginário – que nos possibilita criar relação internas e externas.


Bestiário
2017


“Bestiário” é uma experiência curatorial que aponta para o excesso. Não desejamos a frieza e o largo espaço de respiração comum aos cubos brancos para as obras aqui reunidas. Pelo contrário: é justamente a sobreposição de imagens, volumes e cores que nos interessa. Trata-se de um exercício deliberado de iconofilia e um convite ao mergulho em um campo semântico-iconográfico que lida com alguns aspectos da experiência vital: a alteridade, a incerteza e o medo dados pela apreensão de imagens que apresentam formas que fogem àquilo que convencionamos crer que é o humano.



Randolpho Lamonier

2017

Esta exposição é a primeira vez em que o artista Randolpho Lamonier reúne uma grande quantidade de trabalhos em um único espaço. Em seu percurso institucionalizado por meio de - em sua maioria - exposições coletivas nos últimos cinco anos, chama a atenção a sua constante prática da fotografia; por vezes vemos o registro de diferentes aspectos da metrópole e, em outros momentos, seu olhar se esbarra com outros corpos capturados em aparentes momentos de intimidade.



Óleo fita carbono

2017

O título desta exposição de Carla Chaim aponta para os três materiais centrais às obras aqui apresentadas; mais do que isso, escolher essas palavras denota também a relação entre sua pesquisa e a fisicalidade das coisas. Consequentemente, o lugar que o corpo da artista e o corpo do espectador ocupa em relação às imagens é, portanto, essencial.



Mais do que araras
2017


A presente exposição não ansiou por se apresentar como mais um projeto dedicado exclusivamente à figura mitológica (e essencial) de Oiticica; sua “Tropicália” e seu aniversário de cinquenta anos foram um ponto de partida, mas não de chegada para a reunião aqui proposta de artistas e procedimentos. Não interessava a Oiticica uma produção de arte que caísse facilmente no clichê da tropicalidade, mas sim algo que convidasse o espectador a ter uma perspectiva crítica perante a crescente folclorização da “cultura brasileira” pregada pela ditadura militar.



Repartição

2017

O percurso de Mariana Paraízo no campo das artes visuais é recente e, como ela afirma ironicamente em sua minibiografia, conta com uma passagem por uma incompleta graduação em Letras. É interessante lembrar desse detalhe para termos em mente não apenas o lugar importante que a relação entre imagem e texto desempenha na sua pesquisa, mas para nos lembrarmos de sua atividade também na área das histórias em quadrinhos.



Gustavo Speridião
2017

“A gente surge da sombra” era o título da exposição individual do artista carioca Gustavo Speridião aberta entre os meses de maio e junho na Mercedes Viegas Galeria, no Rio de Janeiro. O título da reunião de obras vinha de um dos trabalhos ali expostos: um longo recorte vertical de tela onde a frase, descentralizada, aparecia em vermelho.



“Toda palavra tem uma gruta dentro de si”
2017

O primeiro trabalho apresentado por Mariana Manhães em uma exposição data de 2004 e se intitula “Memorabilia 1”. Mostrado no Parque Lage, se trata de um vídeo em que um jarro é filmado em preto-e-branco e mostrado numa pequena televisão cuja estrutura eletrônica fica aos olhos do público. O protagonista do vídeo advém de um campo semântico central às investigações da artista: o recanto da domesticidade e o uso de objetos utilitários banais que, sob sua batuta, saem do campo da apropriação à la ready-made e se transformam em personagens animados. E se os nossos cacarecos falassem?



Vera Chaves Barcellos
2017

Em entrevista publicada no catálogo “Imagens em migração”, de 2009, Vera Chaves Barcellos responde a uma série de perguntas feitas pela curadora Glória Ferreira. Entre questões sobre sua trajetória, uma de suas falas parece interessante como introdução: “a gravura e a fotografia tem em comum a possibilidade de se tirar cópias e isso também é um vício quase, se torna um vício quando se faz gravura, de ter aquela possibilidade das cópias. A minha resistência à pintura, por essa ser uma peça única, também tem relação com essa possibilidade de multiplicação”.



Luiza Baldan
2017

Voltando ao referido texto, a artista pintou sobre uma das paredes frases que giram em torno de sua experiência recente em expedições vivenciais e fotográficas pela Baía de Guanabara, elemento paisagístico essencial para a construção de uma identidade e imagem cariocas. Seu texto, porém, não era informativo e, assim como as ondas, tinha um divagar curvilíneo. “Sabe-se lá de onde vem o fascínio pelo mar”, dizia a primeira frase para, mais à frente, outro trecho como “A maré que baixa e o fedor que sobe” quebrar com qualquer apreensão romântica de um espaço natural que é tomado pela poluição e pelo lixo. 



Falso histórico
2017

O conceito que dá título à exposição do duo Lecuona y Hernandéz perpassa a sua trajetória de mais de vinte anos como criadores a quatro mãos. Baseados em Tenerife, nas Ilhas Canárias, sua pesquisa é mais baseada na criação de imagens dotadas de mistério do que em uma verborragia panfletária. Se inicialmente a dupla realizava pequenas ações performáticas perante o público ou a câmera, nos últimos dez anos seu trabalho se apresenta de forma mais tridimensional e com uma necessidade de dialogar com o espaço arquitetônico que o abriga.



Resenha de “Viagem pitoresca e história ao Brasil”, de Jean-Baptiste Debret (org. Jacques Leendhardt, 2015)
2017

O presente ano de 2016 é um momento de comemorações e lembrança dentro do campo dos estudos da arte e da imagem durante o século XIX no Brasil. Trata-se da celebração dos duzentos anos da vinda de um grupo de artistas franceses para o Rio de Janeiro, em 1816, então capital do Império Luso-Brasileiro. Essa viagem foi posteriormente batizada de “Missão artística francesa” e se trata da soma de dois desejos: a saída do território francês de artistas um dia associados politicamente a um Napoleão em iminente queda política e, por outro lado, o desejo por parte do imperador português D. João VI de haver uma escola de belas-artes em território brasileiro. 



Coros
2017

A exposição "Pintura (diálogo de artistas)" apresenta desde o título os seus parâmetros. Trata-se, em primeiro lugar, de uma reunião de trabalhos relativos a uma mesma linguagem, a pintura. Seus suportes tradicionais - penso aqui na equação clássica da aplicação de tinta diretamente sobre a parede ou sobre tela - são problematizados por alguns dos doze artistas convidados para compor o projeto: Zalinda Cartaxo realiza uma instalação que ocupa uma sala, Hugo Houayek mostra objetos feitos com gesso e Willian Santos contribui com um trabalho entre a pintura e a escultura, dividido entre a parede e o chão.


Responder a tod_s
2017

Esse texto (que, prometo, será curto) nasce depois de um dia inteiro na montagem de “Responder a tod_s” – ou seja, é um texto que é fruto do cansaço. Escrever sobre esse projeto, porém, não faz sentido se é feito de outra maneira. Essa curadoria nasce justamente do contato diário, das tentativas de comunicação, da ausência de certeza sobre _s outr_os e, especialmente, do cansaço e delícia das montagens.



Linhas azuis
2017

Podemos afirmar que a pesquisa de Danielle Fonseca se articula essencialmente na relação entre imagem e texto. Além de ser uma criadora dentro das chamadas “artes visuais”, a artista se caracteriza também pela sua produção como escritora.



Mayana Redin
2017

Entre os meses de novembro e dezembro foi realizada a primeira individual de Mayana Redin na galeria Silvia Cintra, no Rio de Janeiro. Intitulada “Arquivo escuro”, a exposição chamava a atenção inicialmente devido à ambientação escolhida pela artista: no lugar da iluminação hospitalar comum do cubo branco, ela preferiu transformar o espaço numa caixa escura onde a própria luz de algumas obras geralmente dava o tom de iluminação ao todo. Essa opção remetia ao uso da palavra “escuro” no título da exposição e convidava o corpo do espectador a uma particular experiência física. A artista dividia com o público um arquivo de suas experimentações recentes.



Alair Gomes
2017

Após passar com importante repercussão pela cidade de São Paulo, a exposição “Alair Gomes: percursos” pousou sobre a cidade-natal do fotógrafo: o Rio de Janeiro. Com curadoria de Eder Chiodetto, a exposição trouxe à Caixa Cultural quase trezentas fotografias realizadas pelo artista em um arco temporal que se estende da década de 1960 ao final de 1980.



Suturas
2017

Desde que a exposição de Raquel Nava teve sua montagem finalizada, um elemento me surpreendeu: a presença da cor nas suas composições. Mesmo com suas imagens perante os olhos nos últimos meses, nada se comparou ao efeito de ver estas fotografias impressas em tamanhos diferentes e em diálogo espacial com os objetos apresentados. Saímos do campo da projeção virtual e entramos na esfera do embate entre seus trabalhos e o corpo do espectador.



Jamaican pulse
2016

Realizada entre os dias 25 de junho e 11 de setembro, a exposição “Jamaican pulse: art and politics from Jamaica and the diaspora” foi realizada no Royal West of England Academy, na cidade de Bristol, na Inglaterra. Conforme os textos compartilhados com o público afirmavam, se tratava da maior exposição já feita em solo inglês a respeito da produção de arte na Jamaica e em uma cidade que concentra o terceiro maior número de jamaicanos no Reino Unido.



My body is a cage
2016

“My body is a cage” retira seu título da música homônima da banda canadense Arcade Fire. Conforme dizem seus versos, “My body is a cage that keeps me / from dancing with the one I love / but my mind holds the key” (“Meu corpo é uma jaula que não me deixa / dançar com o meu amor / mas a chave está na minha mente”), ou seja, se trata de uma música que reflete sobre a inevitável prisão à qual todos os humanos estão condicionados biologicamente: o seu próprio corpo.



Reformar
2016

“Reformar” é uma exposição construída a seis mãos pelos artistas Reginaldo Pereira, Renata Cruz e Renato Leal. Mais do que uma exposição coletiva, poderíamos afirmar que se trata do encontro entre três artistas que se transformaram em bons amigos e que pensaram detalhe a detalhe deste projeto, entre ideias mil e cafés.



Mmakgabo Helen Sebidi - 32a Bienal de São Paulo
2016

A artista sul-africana Mmakgabo Mapula Helen Sebidi desenvolve sua pesquisa nas linguagens do desenho, escultura e pintura desde a década de 1960. Nascida na zona rural da África do Sul, logo jovem trabalha como auxiliar doméstica de diferentes famílias que viviam em Johannesburgo. O fazer artístico era algo presente em sua vida devido à sua avó que era pintora de paredes e trabalhava com cerâmica, tendo ensinado a Sebidi algumas técnicas desde sua infância. 



Ursula Biemann & Paulo Tavares - 32a Bienal de São Paulo
2016

“Forest law” [Selva jurídica] (2014) é um projeto da artista suíça Ursula Biemann e do arquiteto brasileiro Paulo Tavares. O trabalho de Biemann se baseia nas relações entre meio ambiente, território e modos de representação. Os resultados de sua imersão em distintos contextos sociopolíticos são apresentados por meio de documentos, livros e vídeos. Desde 1999, a artista realiza projetos que tratam da relação entre corpos individuais e fronteiras geográficas, culturais e de gênero.



Ebony G. Patterson - 32a Bienal de São Paulo
2016

A pesquisa de Ebony G. Patterson parte da vivência cotidiana em Kingston, e da observação de expressões da cultura popular. Seja em formas bidimensionais, pintura, desenho e colagem, seja em tridimensionais, como esculturas, instalações e performances, sua obra é pautada por uma ampla utilização de cor, ornamentos e grandes escalas, em gestos que prezam pela contundência da acumulação de elementos. A artista se vale inicialmente da fotografia e daí transpõe as imagens capturadas para a tapeçaria. 



Misheck Masamvu - 32a Bienal de São Paulo
2016

Mischeck Masamvu tem sua pesquisa artística baseada nas linguagens do desenho, da escultura e da pintura. Geralmente trabalhando com escalas médias ou grandes, a fisicalidade de suas pinturas a óleo cria um apelo que parece desafiar o corpo do espectador. As imagens de Masamvu podem ser vivenciadas a distância, mas também convidam a uma contemplação detalhada de suas proposições narrativas e formais.


Cecilia Bengolea & Jeremy Deller - 32a Bienal de São Paulo
2016

Cecilia Bengolea é coreógrafa, dançarina e artista performática. Com o intérprete François Chaignaud criou a companhia Vlovajob Pru em 2005. Entre os diversos interesses de sua investigação, chama a atenção o diálogo estabelecido entre uma linguagem institucionalizada como “dança contemporânea” e explorações do corpo oriundas de contextos populares massificados ou de grupos sociais específicos. Para a 32ª Bienal, Bengolea desenvolve com Jeremy Deller – artista com quem colaborou em 2015 – um projeto que parte de diferentes linguagens para pensar de modo crítico e irônico a sociedade contemporânea e suas relações com a economia, as condições de trabalho, os sistemas políticos e as referências à cultura popular.


Ivens Machado
2016

Ivens Machado, artista brasileiro nascido na cidade de Florianópolis, em 1942, faleceu em maio de 2015. Vivendo no Rio de Janeiro desde 1964, começou a expor com regularidade e ganhar a atenção da crítica durante a década de 1970. Sem realizar exposições individuais desde 2011 – quando desenvolveu um grande projeto na Casa França-Brasil, no Rio de Janeiro –, o artista faleceu sem ter o reconhecimento internacional de parceiros geracionais como, por exemplo, Cildo Meireles. Conforme percebido de modo perspicaz pela galerista Marcia Fortes em texto de 2015, ele e o artista estadunidense Chris Burden faleceram na mesma semana e possuíam pesquisas claramente dialógicas.


Le petit musée  
2016

A pesquisa de Ismael Monticelli se desenvolve a partir de diferentes linguagens. Se por um lado podemos perceber que seu olhar se constrói em diálogo com a fotografia e que algumas de suas obras são apresentadas nessa mídia, por outro lado não podemos fazer vista grossa à sua experimentação com a produção de múltiplos, a construção e apropriação de objetos e a apresentação de instalações. Fulcral à sua produção é a relação entre imagem e texto, mas sempre de modo distante da ilustração e da nostalgia do livro impresso; palavras e frases se fazem essenciais na medida em que incentivam a projeção mental de novas imagens. 


Saber contar

2016

O título da recente exposição individual de Rochelle Costi na Anita Schwartz Galeria, no Rio de Janeiro, dá um norte duplo para as imagens ali organizadas pela artista. Se por um lado a palavra “contabilidade” remete, segundo um dicionário, à “ciência de caráter teórico e prático que se dedica ao estudo dos métodos de cálculo”, por outro lado ela também pode ser vista como a junção entre as palavras “contar” e “habilidade”.



Saudade e o que é possível fazer com as mãos  
2016

A palavra “saudade”, a primeira parte do título desta exposição individual de Raquel Versieux, pode ser relacionada de modo amplo à sua pesquisa. Com cerca de dez anos de percurso, a artista investiga a relação entre corpo humano e paisagem em diversas técnicas e operações de construção de imagens. A fotografia e a criação de objetos tridimensionais são alguns dos interesses mais frequentes em seus trabalhos.



Reply all
2016

“Reply all” comes from a daily experience – being part of the Manchester School of Art for the last three months as a PhD student. More focused in the All Saints Library and in the process of finishing my own thesis, I still got very curious to understand how the university structured the graduation and master degree art courses. The curiosity and inevitable comparison with the relation between art and education in Brazil led me to the seed of this exhibition: why not work together with artists that are students from the MSA?



A beginner’s guid to Brazilian art 
2016

To only write briefly about the relationship between Brazil and contemporary art is certainly a crime. With a population estimated at more than two hundred million and an area covering more than eight million square meters (the United Kingdom could fit into it 35 times), it’s absolutely impossible to define precisely what “Brazilian culture”, “Brazilian contemporary art” and of course, “Brazilian-ness” could be.



Fé na Atlântida
2016

A Virgem do Alto do Moura, pesquisa artística e divindade criada por Nadam Guerra, caminha para o seu segundo aniversário oficial. Inicialmente apresentada na primeira edição da Bienal do Barro, realizada em Caruaru (Pernambuco), em 2014, a proposição ia de encontro com as histórias da cidade e da região. Na parte alta da cidade, precisamente no Alto do Moura, habitava o Mestre Vitalino, escultor de imagens feitas com barro que se popularizou entre as décadas de 1940 e 1960, falecendo em 1963.



Zimbeta
2016

Ao observar a presente exposição de Rodrigo Martins na Central Galeria, alguns elementos são constantes. É possível destacar, em primeiro lugar, a presença da pintura e da escultura como linguagens norteadoras da sua criação de imagens. Em um segundo momento, no que diz respeito àquilo que poderíamos chamar de “assunto” das suas obras, chama a atenção a recorrência de elementos que remetem à anatomia humana. Essa relação triangular entre escultura-pintura-figuração, porém, não se trata de uma equação de fórmula óbvia e é sobre o seu tensionamento que a produção do artista parece estar concentrada.


Campo de dispersão
2016

Ao se observar a trajetória de Juliana Kase, é notável o importante lugar ocupado pelo desenho e suas possibilidades de articulação. Se em algumas vezes a técnica foi exercida através de uma perspectiva mais tradicional, ou seja, a partir do contato entre lápis e papel, em outras oportunidades a artista pensou a linguagem através de seus diálogos com o espaço público, a arquitetura e a instalação. Parte da pesquisa que a artista desenvolve nos últimos anos gira em torno da utilização da fotografia e da materialização de fotogramas que geram narrativas sequenciais a partir da apropriação de objetos.



Indices: tres operaciones entre imagen y texto en Brasil
2016

Siendo la presente edición de Solemne basada en la relación entre imagen y texto desde la perspectiva de las artes visuales, empecé a pensar sobre cómo hacer una contribución desde Brasil. Si pensamos en una perspectiva histórica, la relación entre cultura visual y texto en Brasil es larga y pasa desde los libros publicados por viajeros extranjeros que exploraran nuestro territorio desde el siglo XVIII hasta las experimentaciones con la poesía concreta principalmente en la década de 1950 por Augusto de Campos, Décio Pignatari y Haroldo de Campos.


many-splendoured thing
2016

Essa exposição é também sobre a história de Thomspon Vitor, estudante brasileiro. Tudo começou com o encontro entre Gê Orthof e a notícia sobre um jovem nascido em Natal, capital do estado do Rio Grande do Norte, que havia sido aprovado em primeiro lugar para o concorrido concurso do Instituto Federal de Educação. O que chamava a atenção na narrativa é que o rapaz estudou a partir de uma série de livros que sua mãe, catadora de lixo, encontrou em seus percursos pela cidade.



I wish I was dead already
2016

Há um quadro de autoria de Ramonn Vieitez que me parece icônico quanto à sua pesquisa como criador de imagens. Intitulado “Teo at Paris”, a pintura apresenta uma figura com traços joviais sentado diante de uma mesa e enquadrado no canto de uma sala. É nesse espaço compositivo asfixiante que somos apresentados aos diversos objetos que acompanham Teo – canecas, copos e taças se avizinham em um espaço em que café e vinho são possivelmente amigos de muito tempo. Que tipo de ambiente é esse onde uma mesa se transforma na base do personagem? Trata-se de um escritório ou de um quarto?



A grande honra ao mérito
2016

Do alto das prateleiras para o chão – este é um dos deslocamentos feitos por Elen Gruber no projeto “A grande honra ao mérito”. A base onde as condecorações estão reunidas frisa sua repetição e esvazia temporariamente os seus contextos específicos. Os objetos que então convidavam a uma apreciação ascendente do corpo, remetendo a idolatria e respeito intocáveis, na organização proposta pela artista são integrantes de uma massa dourada que realça a planaridade do chão e a materialidade das peças.



Ganimedes
2016

A presente exposição de Zé Carlos Garcia dialoga com este mito. Com uma trajetória de cerca de dez anos como artista, é possível aproximar sua pesquisa à mutação entre o humano e o animal vivenciada por Zeus. As esculturas e objetos gerados pelo artista se encontram por diversas vezes entre o reconhecimento estrutural de móveis e anatomias animais, e o estranhamento proporcionado pela plasticidade dilacerada dos corpos estranhos que se instauram. De uma antiga cadeira de madeira saem penas de um pássaro e da trama de palha de outro móvel brota um pequeno inseto.



Composições
2016

O trabalho de Darío Escobar não deriva exatamente dessas duas rápidas aproximações, mas certamente é dialógico ao desejo de compor imagens a partir da geometria, tal qual observado não só na pesquisa de Kandinsky, como também em diversos outros artistas modernistas e contemporâneos. As composições de Escobar se desenvolvem, geralmente, a partir da apropriação de objetos industriais que possibilitam atos escultóricos e instalativos.



Eduardo Viveiros de Castro
2016

A que se deviam essas opções cromáticas ousadas, mas que certamente injetavam vivacidade na exposição? Tratava-se da reunião de cerca de duzentas e cinquenta fotografias realizadas por Eduardo Viveiros de Castro, reconhecido antropólogo brasileiro e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Cada vez mais lido tanto no ambiente acadêmico das ciências humanas, quanto por um público interessado nas suas pesquisas em torno de distintos grupos indígenas no Brasil, o autor tem entre suas publicações de mais destaque títulos como “A inconstância da alma selvagem e outros ensaios de antropologia” (2002) e o recentemente publicado “Metafísicas canibais” (2015).



Esse coqueiro que (até) dá coco
2016

Em "Boi neon", longa-metragem dirigido por Gabriel Mascaro e lançado recentemente, os personagens são mostrados diversas vezes a travar diálogos relativamente longos. A direção não enquadra seus corpos nem através de planos muito abertos, que os colocariam como parte da paisagem, nem também através de imagens muito próximas e detalhadas. A câmera observa, então, algo que acontece ali, nem perto, nem longe do público, mas geralmente apresentado através de um movimento muito sutil de zoom in.



Os 12 filhos da Virgem do Alto do Moura
2016

Como é sabido, as circunstâncias biográficas desse importante artista brasileiro levam a caminhos historiográficos bifurcados. Há aqueles que acreditam que o artista teria sido nascido no estado de Minas Gerais durante a Grande Virada, além de outros que pensam que ele teria produzido essas esculturas apenas no século V depois dessa mesma Virada. Nem mesmo as fontes de seu projeto iconográfico foram localizadas – seriam elas frutos de uma visão divina de um artista contemporâneo à passagem da Virgem ou alguém que se baseou na fonte textual mais referida aos acontecimentos, ou seja, “Os 12 passos da Virgem do Alto do Moura”?



“Sonhei que eu acordei e começava a gravar o sonho”
2016

Após a última grande exposição dedicada à memória de Leonilson, realizada na Estação Pinacoteca, em São Paulo, e que viajou posteriormente ao CCBB de Belo Horizonte, o nome do artista volta à tona devido ao lançamento de um documentário dirigido por Carlos Nader. “A paixão de JL”, ou seja, de José Leonilson, baseia a maior parte de suas imagens em gravações feitas em fitas K-7 pelo artista em um percurso de 1990 a 1993.



Francisco de Holanda e o retrato em Portugal
2016

Este artigo tem como ponto de partida os textos de Francisco de Holanda, artista português ativo entre o segundo quarto e o final do século XVI. Esta análise tem como objeto os seus escritos no que diz respeito ao elogio de artistas portugueses no campo do retrato, como Nuno Gonçalves e seu pai, Antônio de Holanda, lidos nos seus textos “Da pintura antiga” (1548) e “Do tirar pelo natural” (1549). Junto a essas afirmações, se fez necessário um cotejamento em conjunto com a produção de retratos em Portugal durante o Renascimento, além das obras da própria autoria de Francisco de Holanda.



Quando o tempo aperta
2016

A semente desta exposição é o projeto apresentado pelo arquiteto Lucio Costa na XIII Trienal de Arquitetura de Milão, realizada em 1964. Tratava-se da primeira vez que o Brasil havia sido convidado para o evento que nessa edição tinha como tema o “tempo livre”. Foi criado um ambiente a partir de catorze redes de dormir coloridas com uma frase em italiano no imperativo acima delas – “Riposatevi” [Repousem]. O pavilhão recebeu destaque por convidar à participação ativa do corpo dos espectadores que poderiam deitar nessas redes e dedilhar os violões espalhados no espaço. Nas paredes, fotografias de Marcel Gautherot mostravam os jangadeiros do Ceará em contraste com imagens de Brasília.


Claudia Andujar
2015

Devido à exposição “No lugar do outro”, de Claudia Andujar, em cartaz no Instituto Moreira Salles do Rio de Janeiro entre os meses de setembro e novembro, foi publicado um catálogo com reprodução das imagens expostas e uma entrevista exclusiva da artista. Após responder perguntas sobre sua infância, a fuga do nazismo e o trânsito entre a Europa e os Estados Unidos, a entrevistada comentou sobre o início de sua relação com a fotografia: “Minha mãe tinha uma máquina, ela fotografava, mas era como tanta gente. Para mim era uma maneira de me relacionar com o Brasil, nunca pensei que ia ser fotógrafa. Foi só depois que eu já fotografava e isso me dava um prazer muito grande que conheci gente que me encorajou”.



Cuba - ficción y fantasia 
2015

É difícil visitar a exposição “Cuba – ficción y fantasia”, a última coletiva a ser realizada no prédio, sem que essas informações venham à reflexão. Com curadoria de Hans-Michael Herzog (curador-chefe da Daros Latinamerica Collection) e Katrin Steffen, a exposição não pretende, segundo seu release, “abarcar todas as correntes artísticas de Cuba, mas transmitir uma excelente ideia das facetas mais importantes desta produção nas últimas décadas”. Com mais de uma centena de obras de dezessete artistas e com um arco temporal que vai de 1975 a 2008, a curadoria certamente abarca distintos pontos de vista da triangulação sugerida pelo seu título entre Cuba, ficção e fantasia.



Alla prima
2015

O que Tiago Cadete propõe com “Alla prima” vem de uma inquietude também perante o silêncio e imobilidade das imagens. O corpo humano, essa espécie de unidade fundamental da produção de imagens no Ocidente, é tanto o enfoque de sua pesquisa enquanto colecionador de imagens, como o instrumento através do qual o próprio corpo do intérprete se colocará perante o público. O seu olhar diz respeito à construção e invenção do Brasil – quais seriam os movimentos e vozes do grande número de imagens que em mais de cinco séculos foram capazes de criar certas ideias sobre o que seria o Brasil, os brasileiros e a brasilidade?



Benvenuto Chavajay
2015

Quando o artista Benvenuto Chavajay intitulou sua primeira exposição individual na Galeria Pilar, em São Paulo, por “Diamante típico”, trazia à nossa memória toda essa carga de significados que a pedra preciosa evoca. Ao circularmos no espaço expositivo e contemplarmos as imagens ali compartilhadas com o público, ficava claro que se tratava de um uso mais sarcástico das palavras e, no lugar da ostentação, éramos confrontados com a precariedade dos materiais utilizados na composição das obras.


Entrevista com Aracy Amaral
2015

“Repito sempre: o Brasil são muitos países e a incomunicabilidade é nossa marca justamente por nossa extensão e riqueza de diversidade. Se uma pessoa do Rio não vem a São Paulo não sabe o que se passa aqui, e vice-versa. E São Paulo possui uma alavanca que são os centros SESC por toda a parte. Por outro lado, vemos grandes cidades do Brasil se autonomizando em artes visuais, como Belém. No Nordeste uma forte vinculação com a Europa, há poucos anos, existia em função das atividades do Instituto Goethe...”



Daniel Lannes
2015

“Colônia” era o título da exposição individual do artista carioca Daniel Lannes apresentada nos dois espaços da Baró Galeria, em São Paulo, entre os meses de maio e junho. Essa palavra é capaz de ativar a memória do público de diversos modos, mas se este se trata de alguém que acompanha há algum tempo a trajetória do artista, possivelmente deveria associá-la a um dos seus interesses rotineiros: a História das imagens relativas ao Brasil.



Damián Ortega
2015

Entre os meses de abril e junho, o Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro recebeu a exposição “O fim da matéria”, do artista mexicano Damián Ortega. Pude experimentar a fruição do trabalho pensado especialmente para o museu em dois momentos bem distintos. O primeiro se deu na véspera de sua abertura, ao visitar outras exposições da instituição. O pólo oposto foi quando retornei ao espaço na última semana do projeto e pude acompanhar as diversas alterações do seu estado inicial.



Entre aqui e lá: pontos de fuga
2015

Poderia ser mais uma imagem da internet. Na verdade, não poderia; ela é. Em uma fotografia a cores vemos céu, grama, árvores, um monumento e o corpo humano. Quase ao centro da composição, a Torre Eiffel ultrapassa as margens da imagem. À sua frente, com uma manga de camisa vermelha, alguém aponta o dedo do meio para ela. O gesto agressivo apenas endossa o caráter pouco nobre dessa imagem. Qualquer um de nós poderia ter realizado esta fotografia, assim como ilustramos e alimentamos as linhas do tempo do Facebook com memórias descartáveis de nossas breves passagens.



Marcadores
2015

Ao acompanhar o processo de criação e pensamento espacial de Iris Helena para essa exposição, é possível aproximá-la conceitualmente daquele mesmo costume de marcação de páginas. Sem livros dentro do espaço expositivo, são as paredes da galeria que são marcadas por suas mãos. Os papéis aqui não atribuem importância a um objeto impresso, mas são eles próprios a superfície da impressão. Atribui-se a eles, então, uma importância dialógica aos nomes próprios, conceitos e imagens encontrados nos livros outrora marcados.



Katú Kama-rãh: amizade, imagem e texto segundo Algot Lange
2015


Em 28 de setembro de 1912, é publicada no New York Times uma matéria sobre o engenheiro naval e então almirante da marinha brasileira José Carlos de Carvalho. Intitulada “Calls America a great school”, o texto versa sobre seu encontro com o jovem explorador e escritor sueco Algot Lange, durante a Terceira Feira Internacional da Borracha realizada em Nova Iorque e da qual o brasileiro era vice-presidente da comissão organizadora. Segundo a escrita, Lange faria uma expedição na região abaixo do rio Amazonas com financiamento da Universidade da Pensilvânia e com interesse do governo brasileiro no que diz respeito ao registro biológico e etnográfico de uma área supostamente “não explorada pelo homem branco” até então.



Leg godt
2015

Mais do que não conhecer anteriormente o trabalho de Joaquín Rodriguez del Paso, era minha primeira viagem a San José, capital da Costa Rica. Logo nesta primeira entrada em uma instituição local – o Museo de Arte y Diseño Contemporáneo –, me deparei com um espaço de mais de dois mil metros quadrados tomados por obras que percorriam os cerca de vinte e cinco anos de produção do artista costarriquenho. 



Osmar Dillon

2015

O Centro Municipal de Arte Hélio Oiticica, no Centro do Rio de Janeiro, abrigou por dois meses uma reunião de trabalhos de Osmar Dillon. Nascido na cidade de Belém, no norte do Brasil, em 1930 e falecido no Rio de Janeiro em 2013, o artista participou da segunda e terceira edições da Exposição de Arte Neoconcreta, realizadas no Rio de Janeiro e em São Paulo. Essa revisão de seu trabalho faz jus, portanto, ao artista que dá nome à instituição e às narrativas paralelas à sua obra, visto que Oiticica, além de participar das três exposições do neoconcretismo, também foi um dos autores responsáveis por assinar o Manifesto Neoconcreto, em 1959.



Matías Duville
2015

“Mutações” era o título da exposição individual do artista argentino Matías Duville no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. Aberta entre os meses de março e maio, se tratava de uma boa oportunidade para ver reunidas em um mesmo espaço obras realizadas desde 2000, representativas dos mais de quinze anos de sua pesquisa. Logo na entrada do espaço expositivo, em um corredor, o público era convidado a repousar o olhar sobre “Field”, obra de mais de seis metros de largura e realizada com carvão sobre papel.



Algumas perguntas para Marina Abramovic

2015

“Lygia Clark é uma grande artista brasileira da performance. Eu respeito o seu trabalho, mas não acho que temos nenhuma similaridade direta no que produzimos. Eu acredito, de todo modo, que ambas estamos interessadas em alguns conceitos similares enquanto ser humanos, como os diferentes estágios de consciência que experimentamos e os limites mentais e físicos que compartilhamos”.



Soy un perdedor, I am a god

2015

Quando Alvaro Seixas me convidou para escrever esse texto, veio com o nome da presente exposição definido: “Paintbrush”. Conversamos em seu ateliê e pude ver alguns dos trabalhos aqui apresentados. Modernismo, pintura, abstração e História foram algumas das palavras-chave que rondaram a nossa conversa. De todo modo, elas não me pareciam dar conta da irreverência que o título “Paintbrush” pode conter.


Crônicas e intervenções
2015

de onde advém o título da exposição? Trata-se de uma referência a um trabalho apresentado em 1984 – ou seja, trinta anos da abertura da presente exposição – pelo Group Material, sediado em Nova Iorque. Organizado em 1979 e visando a criação de trabalhos com reflexões sociais dadas de forma coletiva, o grupo apresentou dentro de uma proposição de outro grupo, o Artists’ Call Against US Intervention in Central America, um trabalho acerca das intervenções feitas pelos Estados Unidos nos territórios da América Central e da América Latina como um todo. 


Nelson Leirner
2015

Nelson Leirner possui um percurso de mais de cinquenta anos de produção, desde sua primeira exposição individual de 1961. Sua produção é extensa e multifacetada, baseada tanto em obras em pintura e desenho, quanto em alguns trabalhos que tinham uma dimensão de inserção em vias públicas e, mais recentemente, em instalações e esculturas que mostravam sua fome de colecionador de objetos. Sua atuação perpassa distintos momentos da História do Brasil – da censura da ditadura militar ao crescimento do mercado de arte na última década.



“Não temo quebrantos”
2015

No que diz respeito às novas pinturas e desenhos apresentados no Santander Cultural, o primeiro dado que me chama a atenção diz respeito à monumentalidade da forma que não está contida exclusivamente na escala das telas, mas no modo como os corpos as preenchem. Felipe dá destaque às figuras centrais a essas composições e, mais que isso, proporciona um entorno para suas carnes que faz com as que as imagens respirem e as vejamos com clareza. Ainda há espaço para experimentação dos materiais e das pinceladas rápidas, mas esses elementos não se sobrepõem aos corpos, e sim contribuem com seu destaque.



Rachaduras
2015

Ao observar com calma as pinturas reunidas para a exposição “Jardim Cético”, de Rodrigo Cunha, as teorias de Alberti vieram à lembrança. Quinhentos anos separam os dois, sem falar na distância geográfica entre Florença e Florianópolis, mas enxergo esse diálogo através da indicação do autor a respeito do “vidro translúcido” que a
s boas pinturas deveriam emular. Seria possível enxergar essa construção cênica, tal qual um teatro de palco italiano, nas imagens de Rodrigo Cunha?



Ouro de tolo
2015

Ao se observar o percurso de Zé Carlos Garcia, temos à nossa frente uma pequena Arca de Noé; basta passar os olhos pelas imagens de seus trabalhos e somos enfrentados por porcos, pássaros, abelhas e pragas. Nenhum deles, porém, se apresenta por um duplo tridimensional ou através de uma representação mimética dada a partir de um modelo vivo. De vivo, em verdade, seus animais têm muito pouco, já que parece interessar ao artista justamente a fragmentação dos corpos e os resquícios de uma mutilada arca.



Perspectiva

2015

Uma grande formação rochosa ocupa mais da metade das imagens em movimento de “The conquest of the useless”, de Daniel Beerstecher. Observo a assimetria que as extremidades dessas rochas aqui capturadas entre tons de branco e cinza proporcionam no seu contato com o céu, formando um desenho na paisagem. Enquanto isso, na parte de baixo do vídeo, o vento que passava por este momento no espaço e no tempo cria ondas na estrada que é a base da imagem.



Histórias mestiças
2015

O projeto curatorial, portanto, me parece se debruçar justamente em torno de uma arqueologia desse “cunho muito particular” do Brasil - de que modo um extenso conjunto de narrativas colonialistas que enxergava a cultura brasileira como fruto de uma mistura nada pura entre diversas etnias apareceu e insiste em aparecer através de imagens de temporalidades e geografias distintas? No lugar de uma repetição do enunciado de von Martius, Pedrosa e Schwarcz me parecem mais preocupados em, através de uma pesquisa louvável, tentar desconstruir essa leitura simplista e já senso comum do que seria a origem do “povo brasileiro”.


Ocupar
2015

O acampamento organizado por Tiago Cadete substitui o corpo humano de seus interiores por luz. Observados durante a noite, tal qual uma pequena rua de subúrbio, estes pontos iluminam o chafariz e podem ser vistos como ecos desses fatos recentes. Na ausência de um embate entre territórios diferentes (gregos e troianos), a cidade foi palco de um choque entre governantes e povo, entre o Estado e os habitantes.



Imitation of life
2015

Parece-me possível relacionar a sua produção a algumas palavras muito repetidas quando se aborda a criação contemporânea de arte - memória, autobiografia, História e escrita seriam apenas algumas delas que deveriam vir acompanhadas de citações bibliográficas e discussões conceituais mais destrinchadas. Prefiro dizer outra frase um tanto quanto cliché no que diz respeito à abordagem da arte contemporânea, mas que me parece adequada para o que conheço dele enquanto ser humano: Jonas Arrabal é um grande apaixonado pela vida.



Curta de quebra-demanda
2015

A palavra “demanda” me parece bem apropriada no que diz respeito a uma aproximação ao trabalho da Associação Massa Falida. Inicialmente, demandar pode significar a necessidade de presença ou atividade nossa e dos outros. Um trabalho como “Vending machine”, de 2012, demanda tanto do corpo dos artistas – os homens que fazem o lugar de máquina dentro de uma caixa –, quanto do público que se interessa pelo consumo a fim de que esses corpos sirvam a eles.



Figura humana
2014

Esta exposição parte desse fascínio, talvez instintivo, entre humanidade e imagem para refletir a partir das possibilidades que o corpo humano ainda é capaz de proporcionar na cultura contemporânea. Pretende-se, porém, mais do que fazer um inventário de figuras humanas, reuni-las através de uma linguagem artística portadora de uma história específica – a pintura. Tema de debates na teoria da arte desde o Renascimento, o lugar da figura humana já foi tanto pensado por um viés matemático, numa busca por uma simetria perfeita entre as partes (como escrevia Alberti), quanto através de um embate direto entre artista e suporte, sem a necessidade de uma mediação pelo viés do desenho, como pregavam artistas e pensadores da pintura veneziana. 



Leonilson
2014

Pelo período de três meses esteve aberta na Pinacoteca de São Paulo a exposição “Truth, fiction”, um recorte dentro da produção do artista brasileiro Leonilson e com curadoria de Adriano Pedrosa. Nascido em Fortaleza, em 1957, o artista já habitava São Paulo desde os quatro anos de idade. Posteriormente estudante de artes plásticas, é na década de 1980 que sua produção desponta o levando a, por exemplo, participar da célebre exposição realizada na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, no Rio de Janeiro, em 1984, “Como vai você, geração 80?”e da edição de 1985 da Bienal de São Paulo.














Cor de burro quando foge
2014

Fabio tem realizado nos últimos anos uma investigação pictórica a partir de protagonistas geralmente chamados por matutos, caipiras ou capiaus, arquétipos construídos no Brasil desde o século XVIII, mas melhor sistematizados por intelectuais durante o século XIX. Interessante lembrar, por exemplo, que em texto publicado em 1917, o crítico de arte Monteiro Lobato comenta a obra do então falecido pintor Almeida Junior, célebre por suas imagens de homens interioranos do estado de São Paulo.



A casa dos pais
2014

Após conversar com os dez artistas presentes nessa exposição nos últimos meses e explicar um pouco o lugar de origem desse anseio curatorial, eis que percebo estarmos sentados durante a montagem compartilhando nossas biografias em torno dos trabalhos a serem alçados para as paredes. O fato de parte desse grupo de pessoas ter se conhecido durante as rápidas horas de montagem e problematizarem a relação entre produção de arte/imagem e autobiografia de modo tão transparente e informal, mas igualmente capaz de pensarem esses dados também sobre uma perspectiva crítica quanto às suas trajetórias como artistas, me fez crer que esse encontro foi especial.



Água mole, pedra dura
2014

O barro, como o próprio nome do evento indica, não poderia ser deixado de lado. Seja ele enquanto matéria bruta, advindo diretamente do solo e depois moldado pela mão humana, seja ele enquanto possibilidade da cerâmica que fez Caruaru se tornar num pólo de produção importante e famoso por figuras como Mestre Galdino e Mestre Vitalino; aqui ele está novamente presente e recodificado por mãos que se apropriam de diferentes modos de sua potência.



Erro de desenho
2014

Desenhar é um exercício de se colocar entre o controle e o erro deliberado, entre o esboço para um projeto posterior (o desenho como projeto mental) e o espaço de experimentação dado a partir do encontro entre instrumento e superfície. No meio do processo de atualização da versão de 2011 de seu portfolio, Daniela Seixas recebe um aviso de erro do software que utilizava – “a drawing error occurred”. Entre a surpresa e o estímulo que essa mensagem traz à sua pesquisa como artista, resolver salvar a tela de seu computador do modo como estava.



Modernidade acocorada: Monteiro Lobato, Almeida Junior e Césareo Bernaldo de Quirós
2014

Nessa segunda publicação, o autor descreve um personagem arquetípico do interior de São Paulo, a saber, a figura do “caipira”, ou seja, o homem do campo que trabalhava na lavoura com agricultura. Batizando-o por Jeca Tatu, Lobato faz um texto em que realiza uma descrição ácida da indolente figura do trabalhador de certa região do Brasil, fruto da miscigenação entre o homem branco e o índio, e destinado ao fracasso, à miséria e à preguiça.


Xeque
2014

A ideia de ruína é um dado que se faz presente na produção de Daniel Murgel há algum tempo. Ao observarmos seus trabalhos, é possível detectar tanto alguns títulos que apontam para isso (como “A casa arruinada nas pedras”, de 2008/2009), quanto imagens que potencializam esse lugar da transformação da matéria em pó. A verticalidade e clareza do bronze proporcionadas pela estatuária clássica são recodificada e vertida em obras que partem do contato direto com o chão e a esse lugar parecem destinadas.


Inútil paisagem
2014

Diferente de uma exposição individual onde o cubo branco é todo ocupado por objetos facilmente vendidos na tradição das belas-artes (como pinturas, esculturas e desenhos), Schipper opta por dilacerar o espaço sacralizado da galeria comercial. Não se trata de uma atitude inusitada, visto que esta também possui sua trilha do site-specific já percorrida, por exemplo, por projetos recentes de Renata Lucas. De todo modo, em um presente onde feiras de arte e a projeção internacional otimista de um Brasil multicultural deixam muitos artistas num estado histérico, é de se admirar uma proposta que lida com a galeria, essa vitrine para compra, através de outra perspectiva.


“Os trópicos parecem conspirar contra a memória”
2014

Iniciar um texto sobre a experiência de se visitar a terceira edição da Bienal da Bahia, no Brasil, definitivamente não é uma tarefa fácil. O projeto expositivo se espalhou por este que é o quinto maior estado brasileiro quanto a território e o quarto no que diz respeito ao número de habitantes. Cachoeira, Feira de Santana, Itaparica, Vitória da Conquista, Salvador e diversas outras cidades tiveram espaços ocupados por exposições, performances, projeções de filmes e conversas que tinham o evento como ponto de partida.



A bioarte como ponto de partida
2014

Porém, ao se usar a palavra “bioarte”, geralmente não estamos nos referindo aos diversos momentos da história da arte em que imagem e biologia se cruzaram. Por mais que, diferente dos movimentos de vanguarda, inexista um manifesto que tente circunscrever as diretrizes dessa produção, parece ser costumeiro enxergar esse campo como relativo aos artistas que se utilizam de processos típicos das ciências biológicas para a criação de imagens.



Romy Pocztaruk
2014

Após pesquisar sobre o trabalho de Romy Pocztaruk, seria possível nos guiarmos por uma palavra: História. As narrativas que podemos encontrar nos seus trabalhos dizem respeito a uma amplitude geográfica – Nova Iorque, Berlim e Inglaterra ladeiam sua busca pelas ruínas da Transamazônica e de Fordlândia. A fotografia é uma das linguagens mais presentes na sua produção e proporciona ao espectador, como diria Jacques Le Goff, documentos/monumentos.



Sem receitas
2014

Estive na casa de Jorge Soledar há cerca de um mês. Marcamos de conversar pessoalmente sobre o que ele pensava para sua próxima individual na Fundação Ecarta, em Porto Alegre. Não que nosso contato não seja quase que diário (seja pelas ruas do Rio, seja pelas janelas do facebook), mas era preciso dedicar um tempo específico para tratarmos da exposição. No meio da conversa, em vez de seguirmos a projetar e discutir ideias futuras, Jorge comentou que estava no meio do processo de organização de algumas imagens de seus trabalhos anteriores, justamente para pensar em como estruturar o presente livro.



“Sou diplomado em matéria de sofrer”
2014

A exposição de Nuno Ramos na Caixa Cultural do Rio de Janeiro, tinha como estopim a referência para qual seu próprio título aponta, ou seja, a canção “Hora da razão”, composta e interpretada por Batatinha e lançada em 1976. O musicista se tornou mais conhecido devido a regravações de composições suas feitas nessa mesma década que possibilitaram, por exemplo, que o artista tenha escutado essa canção pela voz de Caetano Veloso.



Estrelas de plástico
2014

A pergunta que Mayana Redin nos lança aqui é: e se conseguíssemos fruir esses corpos celestes a partir de sua atual localização geográfica pela cidade? E se esses nomes não fossem distribuídos de modo aleatório na malha urbana, mas constituíssem um projeto de constelações arquitetônicas? Seriam esses prédios próximos historicamente e frutos de um boom posterior à suposta pisada do homem na Lua? Poderíamos falar em um projeto futurista pautado na implementação da arquitetura moderna em diferentes áreas do Rio de Janeiro?


Mancha, risco e o que está por vir
2014

Enquanto isso, Héloïse Delègue apresenta uma série de imagens que apresentam outra exploração formal. No lugar das linhas e de uma construção visual que a aproximaria da gravura, o espectador é convidado a ingressar em labirintos de cor. A dar prosseguimento às suas pesquisas com a pintura, a artista buscou formas que fossem consideradas seminais para uma cultura visual do Brasil. Após pesquisar por imagens daquilo que comumente é chamado por “arte popular”, Heloïse encontrou formas que representavam animais possíveis de serem recodificados em sua pesquisa cromática.


Pão e cultura
2014

Tendo visitado a exposição "Abre alas", realizada na galeria A Gentil Carioca, no Rio de Janeiro, entre 22 de fevereiro e 15 de março, a escrita de Charles Baudelaire me veio à mente por dois motivos. Em primeiro lugar, é um evento que se dá dentro de uma galeria comercial que tem como maior parte de seus diretores artistas com carreiras institucionalizadas.



Didgeridoo
2014

Os novos trabalhos de Renata Cruz apresentados na exposição “Proposta para a atualização de uma enciclopédia” trazem, como seu título denuncia, essa lembrança do conhecer o mundo através da paginação, da imagem e do texto. A partir de seu encontro com um livro chamado “O mundo em que vivemos”, a artista se pergunta: por que não tomar esse mesmo título e refletir sobre aquilo que nos rodeia e nos invade diariamente?



Os meios do caminho
2014

Pode-se começar esse texto com uma citação advinda da cultura brasileira: “No meio do caminho tinha uma pedra / tinha uma pedra no meio do caminho”. Seria possível articular a poesia de Carlos Drummond de Andrade com a residência artística de Renata De Bonis na cidade de Skagaströnd, na Islândia? De quais modos o “poeta das sete faces”, um dos pais da poesia do século XX no Brasil, poderia ir de encontro a esse país por vezes visto como ícone de tudo aquilo – gélido, pequenino e com montes brancos de neve – que seria destoante da imagem da brasilidade? Três são algumas das vias que podem conectar ambos na sua distância geográfica e histórica através dos mais recentes trabalhos da artista.



Cubo mágico
2014

Creio ser possível aproximar este objeto artístico da proposta da Sala A Contemporânea, onde também temos um cubo branco arquitetônico que foi ocupado por diferentes artistas que levaram ao público carioca pensamentos artísticos, linguagens e, por consequência, visões de mundo bem diversas. Um dado deve ser frisado aqui: nesta edição, o projeto ganhou um complemento de peso ao lado do nome da sala, a saber, “Brasil 2012/2013”. Não se trata, portanto, de tornar acessível nessa sala uma produção contemporânea qualquer, mas sim aquela que tem relação com essa palavra-chave de múltiplos significados, o Brasil.



“French fucking idiots” ou chocolate com castanhas de caju
2014

Essa espécie de ansiedade por marcos identitários faz com que exista em Bruges, na região falante do flamenco, um museu chamado “Frietmuseum”, o Museu das Fritas. O “French”, então, da língua inglesa, parece ser justificado através de uma utilização do termo pelos exércitos estadunidenses que chegaram à Bélgica durante a Primeira Guerra Mundial. Ao provar a iguaria local, por estarem baseados na região francófona do país, eles teriam associado a culinária à língua francesa e, voilà, “the French fries”.



Entre o céu e a terra
2014

Algumas de suas séries em serigrafia e xilogravura que versam sobre o céu estavam reunidas em uma parede presas somente com grampos nos lados superiores. O papel se movimentava e mudava a sua forma do mesmo modo que as nuvens nunca se apresentam iguais. Os entalhes da madeira são proporcionais ao seu encontro com os buris. Estes, mesmo nas mãos mais treinadas, oferecem surpresas e criam linhas que nunca irão de encontro literal ao que foi projetado mentalmente.



Engenharia alquímica
2014

Através destas chaves de leitura, as proposições de Steenbock ganham camadas interessantes. A maior parte dos objetos encontrados nesta exposição foram produzidos a partir da articulação de apropriações. Em um deles víamos um martelo preso a um vidro através de uma linha. Seu próprio peso o mantinha em pé, ao passo que a linha ganhava a importância de uma corda que sustenta um alpinista em uma escalada. Poderíamos enxergar certa precariedade aqui; não num sentido da arte povera, ou seja, de um uso de objetos que às vezes eram mesmo resquícios da indústria ou da natureza.



Palco
2014

Ao olhar com calma para “Palco”, um trabalho que não excede os trinta centímetros de extensão, há elementos formais que seguem potentes na sua produção de imagens. A tensão entre figura e fundo aqui se faz presente – um objeto, uma escada, sugere um espaço trancafiado devido à sua escala. As linhas gravadas na madeira reforçam e ao mesmo tempo combatem o preto que toma conta da obra – este sugere uma imensidão pelo viés da cor, mas nos faz lembrar seu caráter solitário quando recorremos a uma percepção matemática do espaço.



Sala de estar
2014

Nascer, crescer, reproduzir e morrer. Assim lemos nos livros, mas não aprendemos outro verbo importante: voltar. Mesmo cosmopolitas, nossos lugares de crescimento dificilmente são apagados da memória. Jorge Soledar se recordou, então, da oficina de carpintaria que rodeava sua adolescência em Porto Alegre.



O sonho
2014

Nessa exposição individual de Jonas Arrabal há, como seu título anuncia, o desdobrar de uma história próxima ao mito fundador do primeiro grupo ao qual um indivíduo está inserido: a família. A mola propulsora dos trabalhos reunidos é autobiográfica e fala sobre uma “fundação” possível através de outra concepção da palavra que diz respeito ao ato de se erguer uma construção. Enquanto a estrutura familiar, mesmo se assimétrica, já existe anteriormente ao nosso nascimento, o edifício que abrigaria a família Arrabal Aragutti se tratava de um projeto.



Entre o francês e o português
2014

Ao buscar por referências rápidas no que diz respeito à fala de Mestre Vitalino (1909-1963) sobre sua vida e produção artística, muitas vezes me deparei com parte dessa primeira frase, ou seja, “criei-me trancado vivo”. Trata-se de parte de um texto escrito a partir do seu encontro com o intelectual René Ribeiro, antropólogo e professor da UFPE.


Estômago
2014

Seis pinturas compunham a exposição, sendo que a menor delas tinha 360 centímetros de altura e a maior, cinco metros e vinte. Partindo da minha própria altura como medida, é possível dizer que essas duas de tamanho maior eram pouco mais que três vezes mais altas do que eu. Andar pelo espaço e tentar apreender a monumentalidade dessas pinturas foi, portanto, uma tarefa nada fácil. Como dar conta dos detalhes que não alcançava na verticalidade proposta por Thiago Martins de Melo?



Casas
2014

O primeiro dado que saltava aos olhos era a expografia. Rennó se coloca distante da tentativa de transformar um espaço que foi de habitação em cubo branco. Um segundo olhar, porém, perceberá que ela se apropria de uma tessitura típica dos museus, a saber, a utilização de um adesivo que acompanha o espectador até a última das salas e traz informações quanto à cronologia do edifício – uma grande linha do tempo. Esse dado causava uma confusão interessante aos olhos do espectador – seria essa sala uma proposição informativa da direção do museu ou uma proposição artística?



Um texto por dia
2014

Qual não foi, portanto, minha surpresa e felicidade a aceitar um novo convite e refletir um pouco sobre a produção recente e a trajetória de Gonçalo Ivo. Se fui orientado para escrever diariamente, tenho a impressão que esse artista também o foi, porém no que diz respeito à sua capacidade de ser um produtor de imagens. Sendo sua primeira participação em exposição coletiva em 1978, podemos afirmar que seu percurso institucional já abarca mais de 35 anos.



Entrevista com Charles Boltanski
2014

“Primeiro, se você faz uma coleção, ela nunca é concluída. Colecionadores estão sempre insatisfeitos porque há algo faltando, e aí está a beleza de colecionar. Mas, para mim, não se trata de uma coleção, é mais um arquivo, e um arquivo também nunca se conclui. No entanto, é algo mais útil. Não é uma coleção de modo algum! Se o arquivo é sobre pessoas que usam jaquetas brancas no Brasil, é algo útil para a sociologia, para o design de moda. Algo como suíços mortos ou bebês poloneses, por exemplo, são matéria-prima para criar uma obra. Eu não coleciono fotos”.



Anticlássico
2014

Escrevo essa nota introdutória historiográfica, pois, ao entrar na exposição “Pulso alterado”, realizada no Museu Universitario de Arte Contemporáneo (MUAC), na Cidade do México, me veio imediatamente a vontade anticlássica das imagens selecionadas e, porque não colocar assim, a potência de pathos da curadoria. Como os próprios textos dos curadores Miguel A. López e Sol Henaro colocam, a proposta inicial da exposição era de lançar um olhar específico para a coleção do museu; coleção essa, importante frisar, um tanto quanto impressionante para um museu universitário.



Desconforto
2014

Dentro do espaço expositivo, o público pode realizar o seu percurso entre diferentes trabalhos e respostas à tridimensionalidade propostos por Frida Baranek. Um trabalho novo, de 2013, intitulado “Armadilha” recebe o público ao lado de uma de suas imagens mais icônicas e sem título, de 1985. Um inflável vermelho repousa sobre o chão e tem como ameaça uma pedra presa ao teto da sala. Há aqui uma interessante intercessão de elementos da estatuária clássica e das proposições possíveis para uma geração posterior às experimentações de Marcel Duchamp.



Infinitivo
2014

Desdobrar, embolar, costurar, encaixar; poderíamos dizer que a pesquisa artística que Leandra Espírito Santo vem desenvolvendo diz respeito à exploração dos verbos no infinitivo. De diferentes configurações do ambiente e dos modos de registro, seu trabalho tem se configurado como uma “poética do fazer”, ou seja, são imagens que demandam tanto um esforço da artista para construí-las, quanto do público para apreendê-las.



Deslize
2014

Surfe e skate são o norte e o sul desta exposição. Ambos os esportes são vistos em uma perspectiva histórica, mas sem a pretensão do esgotamento. Informações e imagens foram selecionadas a partir de um arco temporal que vai de 1778, quando são feitos os primeiros desenhos dos habitantes do Havaí a surfar, até discussões públicas sobre o lugar dessas atividades no Brasil. Coube refletir sobre a dimensão artística suscitada por essas diferentes formas de explorar o espaço. Seria possível afirmar que alguns artistas têm uma relação existencial tão forte com o surfe ou o skate a ponto de os eleger como elementos centrais de sua linguagem? Parece que sim.



Entrevista com Frederick Wiseman
2013

“Se você se interessa pela maneira como as pessoas se comportam, tem de olhar para elas e ouvi-las. Parece evidente. Nesse sentido, até mesmo os filmes de ficção são observacionais, porque você tem de criar personagens, julgar o que dizem, o que fazem e como agem. Qualquer pessoa que tenha olhos é a todo instante observacional”.



Araucária no chão
2013

Colocado esse ponto, enfrentemos esse desafio de se comentar a Bienal de Curitiba. A edição de 2013 é responsável por fazer o evento chegar aos seus vinte anos e lembrar ao espectador uma trajetória que se iniciava em 1993 com o nome de Mostra VentoSul de Artes Visuais. Nas edições futuras, houve esforço por parte das curadorias a fim de reunir artistas do chamado Cone Sul (Argentina, Chile e Uruguai) somados à representação de artistas do Brasil e Paraguai. Desde 2009 o evento ganhou o nome “bienal” agregado ao seu título, se tornando, em 2011, oficialmente na Bienal Internacional de Curitiba.



O céu de antes
2013

Os trabalhos de autoria de Tales Bedeschi, aqui reunidos, podem ser fruídos através de duas chaves que aparecem indicadas desde o título de sua exposição individual: espaço (“céu”) e tempo (“antes”). De prima, poderia ser dito que as imagens, aqui reunidas, lidam com o tópico da paisagem muito problematizado pela história da arte. Um segundo olhar, porém, incentiva o espectador partir dessa questão e circunscrevê-la melhor - mais precisamente do que a paisagem, se trata de um ensaio sobre o céu.


Ciclo, alma e imagem: sobre a composteira de arte
2013

“Isso parece interessante. Da mesma forma que o artista é que diz se é arte ou não. Para a composteira, foram os artistas que disseram o que devia ser jogado fora. Recebi desde obras perfeitas, que poderiam estar em qualquer galeria, até restos, sobras de ateliê, passando por obras mofadas ou com pequenos defeitos e ready-mades. Jogar fora é sempre um exercício. Para algumas pessoas é muito difícil; para outras, menos”.



Ir
2013

A presente reunião de trabalhos deseja, primeiramente, questionar esta costumeira concepção da sala de exposição como um cubo branco dotado de uma narrativa linear. No lugar de usarmos a figura de uma ponte para o espaço entre as imagens aqui reunidas, talvez fosse mais interessante pensar na ideia de contaminação. Nosso olhar vai de encontro a um trabalho e, de diferentes modos, é direcionado a outra proposição visual. Cada visitante jogará os dados, obterá um resultado e realizará um trajeto espacial singular.



Banco Nacional
2013

A maior parte dos discursos feitos a partir de sua obra dizem respeito, claro, primeiramente, ao desenvolvimento do cinema documentário. Wiseman costuma ser celebrado como uma grande potência no que diz respeito a um chamado “cinema de observação”, ou seja, uma utilização da câmera em que as pessoas filmadas não falam diretamente com a lente, mas são capturadas em recortes de seus cotidianos. O olhar do diretor, portanto, não é tanto o de uma segunda pessoa do singular, mas se aproxima mais de uma terceira do plural.



Moça com brinco de pérola
2013

As pérolas nascem de ostras. Para minha surpresa, esse nascimento se sucede quando o molusco aciona seu mecanismo de defesa, ou seja, é preciso que ele seja estimulado e que seu organismo inflame através do contato com corpos estranhos para que seu manto produza camadas de néctar sobre o elemento externo e surjam as pérolas. Perguntei-me: e não seria o processo artístico de Berna Reale um tanto quanto parecido?



Passaic: o museu desordenado de Robert Smithson
2013

Como o próprio título indica nas entrelinhas, “Um passeio pelos monumentos de Passaic”, escrito pelo artista americano Robert Smithson, trata-se de um relato de experiência. Publicado na Artforum em dezembro de 1967, o texto está baseado num retorno do artista à sua cidade natal. Sua narrativa é construída por intermédio de duas mídias. Pela linguagem literária o autor recodifica sua experiência de percorrer um espaço urbano abandonado e transformado em subúrbio.



Rio sem fumaça
2013

"Rio sem fumaça" se trata da primeira experiência expositiva do Programa de Residências Internacionais do Barracão Maravilha. Seu título vem das placas de incentivo espalhadas pelo Rio de Janeiro para se evitar o hábito do fumo em lugares fechados. O leitor poderia, dependendo de seu conhecimento do português, pensar a frase como uma chamada para a cidade sem cigarros ou entende-la como uma estranha conjugação do verbo “rir” colocada na primeira pessoa da singular, ou seja, eu, o sujeito, rio sem fumaça. Parece que esse jogo de interpretações e palavras é algo que pode ser visto nas formas dos trabalhos produzidos e selecionados por Flurin Busig e Manu Engelen nesse mês que habitaram o solo carioca.



Erros
2013

O trabalho de André Renaud me parece também problematizar a ideia de mimese. Ao dispor sobre o chão dois montes de objetos organizados de modos aparentemente aleatórios, primeiramente poderíamos pensar sobre a relação entre original e cópia. O problema aqui, porém, é que por serem ambos construídos de modo idêntico, formal e cromaticamente, esses termos perdem o sentido. Qual imagem surge primeiro? Qual é o ovo e qual é a galinha?



Uma viagem sem volta
2013

Há cerca de 44 anos, exatamente no dia 21 de julho de 1969, era publicada na capa da Folha de São Paulo uma matéria intitulada “A lua no bolso”. Com uma escrita nitidamente encantada com os avanços tecnológicos, o repórter relatava o contato de Neil Armstrong com a lua a partir do que era observado pela televisão. O homem não apenas entra em contato físico com o astro, mas também estava “recolhendo com uma espécie de longas pinças, as primeiras amostras do solo lunar”. Sim, a lua existia e a ansiedade humana por desbravar novos espaços e demonstrar um “vim, vi e venci” se estendia para além do planeta Terra.



Esculturas
2013

Tive a oportunidade de estar na abertura da exposição "Como me tornei insensível", de Jorge Soledar, na Galeria IBEU, em 15 de maio. Compartilhando o todo com Paula Huven e tornando o espaço uma casa para duas exposições individuais, de imediato chamava a atenção uma comprida estrutura de gesso colocada sobre o chão. Intitulada por "Atravessamento", formalmente, esta imagem cortava o espaço expositivo do modo já anunciado em seu nome, ou seja, atravessado. Estabelecia-se, então, uma diagonal que apontava para uma das paredes do cubo branco, logo ao lado de um dos cantos da sala.



Artesanato
2013

Anna Maria Maiolino foi uma das vencedoras do recém-criado Prêmio MASP Mercedes Benz e, como parte do resultado, teve a oportunidade de realizar uma exposição no museu. Com uma trajetória iniciada na década de 1950, quando ainda residia na Venezuela, a artista ganhou bastante atenção da crítica especializada devido à sua participação na última edição da Documenta, no ano passado. Ao realizar uma grande instalação com argila dentro de uma residência no parque Karlsaue, em Kassel, a artista deu prosseguimento à sua pesquisa iniciada nos anos 90 com sua série “Objetos escultóricos”. Se o público esperava ver trabalhos semelhantes ou adaptações nesta nova exposição no MASP, muito se enganou.



Dois vivas à primeira pessoa do singular
2013

“O que acontece é que na maioria das vezes as obras são para mim um “gatilho” para as coisas que quero discutir. E no fundo gosto de fazer assim, mesmo porque não sei fazer de outro modo. Sou apaixonada por filosofia, pelo trabalho do Panofsky, não tenho muito gosto pela chamada “análise formal”.  Na verdade, o que eu queria mesmo, é ser o Danto... (risos)”.



Sobre o livro “Menos-valia [leilão]”
2013

Além de imagens da instalação e de sua venda na bienal, o livro contém textos escritos por quatro diferentes autores. Partindo de diferentes trilhas, estas escritas acabam por tangenciar um mesmo grupo de referências teóricas. Nomes como o de Benjamin e Baudelaire aparecem nas argumentações. O ato de se leiloar e conseguir se atingir, por exemplo, 30488% de lucro em um dos objetos (seja pelo peso do nome de Rennó no mercado de arte atualmente, seja pela referência explícita a uma obra de Lygia Clark) endossam as reflexões sobre a economia da arte contemporânea.



Complexo/simples
2013

Talvez um bom modo de começar esse texto seja a partir do trabalho de Marcos Chaves, artista convidado da exposição “Travessias”, realizada entre 13 de abril e 23 de junho, no Galpão Bela Maré, no Rio de Janeiro. O artista se utilizou da nona passarela da Avenida Brasil, uma das rodovias mais movimentadas e engarrafadas da cidade, além de uma das responsáveis por unir o centro do Rio de Janeiro ao subúrbio. Foram pendurados dois grandes tecidos com frases: de um lado se lia “Amarécomplexo”, enquanto do outro lado, no nosso suposto retorno, se podia ler “Amarésimples”.


Entre a areia e o mar
2013

Adultos, crianças, mortes, nascimentos, mulheres vestindo hijabs, sinagogas, viagens, natureza, produtos de consumo, guerras; diversas temáticas são cortadas e harmonizadas audiovisualmente pelas mãos da artista. Trata-se de um registro, de um arquivo do jornal que, em sua essência, também arquiva fatos e fotos de um dado momento da História de uma nação, uma cidade ou mesmo, com agá minúsculo, da história de um indivíduo. Vídeo-arquivo não só do estático, mas também do cinema e da televisão, visto que em alguns momentos Leila Danziger volta sua lente para telas com imagens em movimento.



Histórias circulares
2013

Do mesmo modo que mapas se modificam de acordo com as expansões geográficas e novas técnicas de rastreamento e criação de imagem, as apreensões sobre espaços que não são tidos como as raízes de narradores, ou seja, o lugar do “outro”, ganham diferentes tons. Daniel de Roo em seu trabalho “Detour” se apropria de parte da literatura de Hans Staden, famoso viajante do século XVI que, longe de se encaixar na imagem dos naturalistas que posteriormente chegam ao Brasil, vem em busca de fortuna e, por que não, aventura.


Jaguar preto
2013

Há também aqueles felinos que, talvez como Narciso, desejam um autoconhecimento através de uma abertura a uma ideia de “inesperado” talvez não encontrada no Brasil. Mais próximos da figura emblemática de um marinheiro, viajam para rever seus próprios traumas e fazem de suas frágeis âncoras seus divãs. Suas vidas não tem roteiro, mas, como qualquer biografia, é impossível apagar o passado – seja a falta de uma irmã em “Elena”, a saudade da mãe em “Terra estrangeira” ou a entrega quase juvenil à letargia em “Paraísos artificiais”.



Raízes
2013

Um dos trabalhos produzidos por Alice Quaresma durante seu período de residência no Barracão Maravilha é intitulado "Meu canto no mundo". Através de sua lente fotográfica, responsável pela aproximação e distanciamento daquilo que nos cerca, um objeto sem cantos, circular, a artista se pôs a revisitar lugares e interiores que marcaram sua biografia no Rio de Janeiro.


Entrevista com Berna Reale
2013

“Eu penso que arte não necessariamente tenha que ter um compromisso com a verdade. Temos artistas maravilhosos que abordam outro viés, penso sim que o artista tem que ser sincero com o que faz, verdadeiro, isso sim, penso que só comprometido com seu objetivo o artista é capaz de alcançar as pessoas, quer seja falando do passado, presente ou tecendo relações ficcionais”.

Temporão
2013

O movimento parece ser um dos motes da presente exposição de Nena Balthar. Em torno das paredes da galeria, numa ocupação do espaço que toma das bordas do teto até, literalmente, o chão (numa dobradura fictícia do branco desse cubo), está ladeada uma extensa série de desenhos. Como seu próprio título, “Um desenho para cada dia” diz respeito a uma produção de imagens que tem relação com aquilo que já se sucedeu, a saber, o ano de 2012.


Cinzas
2013

Na série “Rua Belgrado”, que o artista realiza desde 2000, o espectador é enfrentado por telas de grandes dimensões, ultrapassando os dois metros de extensão. Utilizando matérias como o óleo aplicado diretamente sobre a tela, betume e carvão, temos construções formais que poderiam ser rapidamente rotuladas por “abstracionismo geométrico”, mas cujo dado mais importante para ser a sutil pesquisa cromática. Tal qual em Beckett, Climachauska parece preocupado com os limites entre o preto e o cinza, ou seja, qual o lugar do supracitado “preto claro”?


Usos da fotografia
2013

Logo na entrada das salas, o trabalho de Pedro Motta recebia o espectador. Sabendo que ele foi o vencedor dessa edição do prêmio, o público tinha um contato já mediado por uma coroa de louros e se debruçava sobre as obras de modo mais crítico. Nascido no Brasil, as imagens criadas por Motta versam sobre a apreensão da paisagem. Não se trata, curiosamente, de um trabalho em que a linguagem fotográfica se coloca no lugar de uma mera documentação do mundo; pelo contrário, me parece que seu trabalho ganha na dimensão em que é capaz de se utilizar de fotografia somada ao desenho e apropriação daquilo que ele registra com sua lente.



Pianinho
2013

Essa exposição é, portanto, um convite ao público para, adaptando as palavras da cantora Tulipa Ruiz, “martelar o tempo para se ficar mais pianinho”. Em diálogo com o próprio título dessa composição (“Efêmera”), é possível dizer que os trabalhos de autoria de Bete Esteves e Leandra Espírito Santo reunidos aqui versam sobre a passagem do tempo através de diferentes pontos de vista. Não creio se tratar de uma consciência do andar da carruagem da vida permeado por um tenebrismo propulsionado por uma culpa cristã; parece mais adequado se olhar para a areia de uma ampulheta (ou para o derreter de uma pedra de gelo) pela ótica da ironia, da nostalgia ou mesmo de uma certa potência de perversão típica da infância.

Redes de dormir
2013

Entre as imagens da alteridade e o assumir da vida através da potência da adversidade, a cultura brasileira vai balançando, em um eterno gerúndio, de cá para lá. Cultua-se o sono e a preguiça, do mesmo modo que são associados de modo pejorativo a algumas regiões do Brasil, especialmente aquelas próximas ao litoral, à vadiagem e malandragem do corpo sensual. Para o bem ou para o mal, é inegável seu lugar de destaque na construção de uma memória coletiva em que o banal gesto de fechar os olhos e se entregar a Morfeu é matéria-prima para a produção de imagens desde o momento do eurocêntrico ato de se destruir o manto que protegia as muitas redes que ocupavam essa extensão geográfica que ainda não se chamava Brasil.


Fita de contenção
2013

Entra-se no MAR pela cobertura. Antes de vermos qualquer exposição, somos convidados a fruir uma vista para a Baía de Guanabara. Visitantes anseiam por fotografias e armam seus sorrisos de cinco segundos. Enquanto isso, na outra ponta da cobertura, vemos um espaço esvaziado que, ao menos nos diversos dias em que visitei o museu, uma fita de contenção proibia de percorrê-lo em sua integridade. Chegando mais perto desta separação, temos o horizonte de um Rio de Janeiro desmatado e com resquícios de uma arquitetura abandonada sobre um morro.


Perpetuum mobile
2013

A proposta conceitual para a exposição "Sete" partiu do próprio convite feito pela Casamata, ou seja, ocupar este espaço por um período de sete dias. Inicialmente, o convite parecia contradizer os habituais prazos de duração de uma exposição, constituídos por algumas semanas em tentativa de prolongar a brevidade de qualquer evento desse tipo. Num segundo momento, a carga simbólica do número de dias serviu como mote justamente para o oposto, a saber, uma celebração do efêmero.


Separar a cabeça do corpo
2013

A refletir sobre esse novo enquadramento urbanístico, o coletivo de artistas Opavivará!, sediado também no Rio de Janeiro, realizou uma intervenção na Praça Tiradentes em 2009. Intitulada “Pulacerca”, esta experiência artística se utilizava de objetos simples, mas com carga simbólica: escadas. Acorrentadas às grades de ferro que rodeavam a praça e pintadas de verde, elas permitiam que qualquer pessoa pudesse atravessar esse muro de ferro que impunha um limite entre ambiente de possível lazer e espaço de correria.



Amar olhar
2013

Talvez mais do que o amor pela arte e pela pintura (capaz de ecoar as referências aqui apontadas, mas ainda devedoras do rótulo “arte”), o trabalho de Luiz Zerbini fale sobre o amor pelo próprio olhar. Em um movimento pendular entre a ordem e o caos, entre o desenho e a cor, sua produção artística nos faz lembrar que a possibilidade da visão em si já é devedora de nosso amor.



Caspar Davir Friedrich e Edward Hopper: a melancolia na relação entre homem e natureza
2013

Não há mais espaço para a experiência. O homem está em um lugar, entronizado como as figuras de sua pintura acima analisada, Os observadores do mar e o que resta da natureza está em outro plano. A melancolia provém dessa solidão do homem. Já não há mais lugar para que ele consiga se recostar. Reconciliar-se não é possível nem mesmo no contato com o outro, que já não existe mais de forma sincera, pairando sobre todos a artificialidade, visível na construção dos corpos das figuras de Hopper, que mais parecem manequins, seja pela sua frieza física, seja pelos seus rostos meramente rascunhados e generalizantes.



Et in Iugoslavia ego
2013

Durante o processo de curadoria e programação da mostra “Cinema pós-iugoslavo”, poucas vezes pude me desviar da lembrança desses conceitos extraídos da história da arte clássica. Ao se partir do princípio de que aqui consideramos as produções feitas em territórios um dia considerados como Iugoslávia, ou seja, posteriores, no mínimo, à Guerra de Independência da Eslovênia, em 1991, é crível que a morte através do próprio conflito surja como tópico comum à maior parte destes filmes.



Sobre o livro “O ano do dragão”
2013

Essas são algumas das palavras escritas por Flavio-Shiró e compartilhadas em livro recém-publicado pela editora Contra Capa. Intitulado “O ano do dragão”, se trata de uma espécie de caderno de uma recente viagem de retorno realizada para seu país de origem, o Japão. Nascido em 1928, o artista chega ao Brasil, no estado do Pará, aos quatro anos de idade. Como diz o texto de orelha escrito por José Eduardo Meira de Vasconcellos, este se trata do quarto retorno feito pelo artista ao seu lugar de origem em uma trajetória que excede os oitenta anos.



Ministro do tempo
2013

Roberto Magalhães, enquanto isso, adapta o título do quadro de Gauguin para um pastel sobre papel em que uma figura humana é protagonista. Inexiste aqui, porém, a frontalidade da face. A solidão de um homem que traja, aparentemente, um terno é delineada pela economia cromática. Após vermos suas costas, temos a bifurcação de seu rosto; metade para a esquerda, metade para a direita. Não existe uma linha reta e o campo da certeza na produção de imagens de Magalhães, mas, antes disso, um convite à dúvida e apreciação mais curvilínea de sua poética.



Lar, estranho lar
2013

Lar, estranho lar. Estranhar o corriqueiro me parece ser também um elemento chave dentro da pesquisa artística de Renato Pera. Podemos partir da apropriação da estranha espacialidade da imagem “infraganti”. Se uma mulher chora e é retirada de dentro de um armário-esconderijo, enquanto seu possível amante é imobilizado por policiais, uma cadeira repousa sobre o chão. Este elemento visual parece ter um caráter mais alegórico do que utilitário; o punctum desta narrativa diz respeito à queda e fracasso de uma relação humana.



36 poses
2013

Fotografa-se para recordar – este aparente lugar comum na abordagem crítica e teórica das imagens, não deixa de ser uma tentativa de compreensão dos objetos fotográficos e, por consequência, dizer respeito à pesquisa artística de Iris Helena. As técnicas de registro visual se alteraram com o tempo, mas o desejo de se criar uma biografia através de imagens permanece – se ontem economizávamos as trinta e seis poses do filme fotográfico (que nunca eram trinta e seis), agora pedimos aos nossos parentes que, por favor, ao menos tenham o trabalho de marcar nossos rostos e clicar na opção “compartilhar”.


Compromisso
2012

Brasil, 2012. “Souvenir Jerusalém” é o título da série fotográfica de Leila Danziger inserida em sua mais recente exposição, “Felicidade-em-abismo”. Na parede à frente da entrada da Capela do Parque Lage, três destas imagens apresentam uma pequena narrativa que gira em torno de dois objetos a interagir com o espaço geralmente transformado em postal quando se fala da cidade do Rio de Janeiro – a praia e as montanhas. Silenciado pela fotografia, lá está o nosso violinista sobre o telhado de uma casinha de madeira pintada de branco.


Braços abertos sobre a Guanabara
2012

Ao lado deste desenho vemos uma escada. Ao se olhar de perto, o material escultórico chama a atenção: ossos e arame. Esse segundo trabalho de Carlos Mélo pode ser interpretado através da própria iconografia do cristianismo. Segundo a narrativa bíblica, após ser crucificado, Jesus teve seu corpo retirado e descido da cruz (João, 19: 38-42). No decorrer desta representação através da pintura, por diversas vezes há a inclusão da escada, objeto que teria auxiliado neste momento anterior à deposição de Cristo. Se os apóstolos utilizaram esses degraus para locomover um cadáver, o artista promove o ato poético de descer o mesmo homem, porém do Morro do Corcovado para o campo da arte contemporânea.


Catarata
2012

O projeto “Ao ar livre”, portanto, me parece uma espécie de desconstrução desse princípio pictórico. No lugar de se imortalizar uma vista se pretendeu, justamente, “destruir” uma representação aos olhos do espectador. Através da linguagem do vídeo, se escolhe, primeiramente, tal qual Taunay, um ângulo para se erguer esse monumento à manifestação da natureza. Enquanto gotículas d’água são percebidas no que parece ser a lente, uma mão pequena titubeia e dá suas primeiras pinceladas. Aos poucos percebemos que aquela que pinta, a própria artista, tenta dar conta de preencher o espaço enquadrado.


Bastão
2012

Dezessete segundos é o tempo que Elen Gruber utiliza de modo semelhante este mesmo bastão de maquiagem em um de seus vídeos produzidos neste ano. Com o rosto em primeiro plano, tal qual um busto de mármore, a artista transforma sua boca em grandes lábios através do vermelho. Na sequência, o contorno é deixado de lado e suas mãos atacam a parte interna de seu corpo – dentes e língua são preenchidos pelo batom que se transforma em pincel. A estrutura que sustenta este objeto é deixada de lado e suas próprias mãos se sujam para que toda a sua face seja coberta. De coadjuvante, o vermelho se torna protagonista; o brinco de pérola se transforma em pintura corporal.


Fechaduras
2012

Entre quatro paredes, uma ação que envolve a troca entre artista e público é inserida em um contexto burocrático. Sobre a luz de uma luminária, ambos tem suas sombras projetadas sobre um rolo de papel que serve de fundo. A ponta do lápis se transforma no vértice de uma faca e o que um dia foi área obscura e fugidia se transforma em figura humana. A intimidade de se resguardar a sombra de um ente querido, narrada deste a Antiguidade através da figura de Butades, aqui é atravessada por um comprovante de movimentação de sombras; documenta-se um impossível controle.


Desnível
2012

Uma série de desenhos relativos à realização de instalações se encontra exposta. De um lado, o público tem acesso ao projeto de concepção mental do artista, ao passo que de outro há o embate com mecanismos efêmeros construídos de modo artesanal. O traço firme do desenho se contrapõe ao movimento que decorre das instalações. O cientificismo da engenharia cede espaço para a fluidez do fenômeno artístico.


Linha aparente
2012

Ao buscar no dicionário uma definição para a palavra “horizonte”, este nos indica ser a “linha aparente ao longo da qual, em lugares abertos e planos, observamos que o céu parece tocar a terra ou o mar”. Trata-se de uma denotação que afasta a linha de seu lugar tradicional de contorno de formas e a transforma em esfumada substância; em vez de delinear um espaço, o desenho se caracteriza por ser o próprio espaço.


Agir
2012

“Eu sou gay” – sujeito, verbo e orientação sexual em três palavras. Se hoje podemos iniciar um texto com esta frase, o livro “Eu, Pierre Seel, deportado homossexual” [Rio de Janeiro, Cassará, 2012] nos traz um relato de um momento adverso à aparente liberdade que a contemporaneidade proporciona. Publicado na França em 1994 e escrito com a ajuda do ativista Jean Le Bitoux, o livro se trata da autobiografia do homem que dá título à obra e tem como enfoque primeiro a sua relação com a homossexualidade e a repercussão social no período da Segunda Guerra Mundial.


Sobre a exposição “Oswaldo Goeldi: sombria luz”
2012

Goeldi contrasta com a produção de arte moderna no Brasil do começo do século XX. Realiza uma exposição individual em 1921, no Rio de Janeiro, mas se ausenta, ao que tudo indica, daquele que se torna marco historiográfico posterior, a Semana de Arte Moderna de 1922. Sua pesquisa artística, como esta exposição mostra de modo coeso, não gira em torno da busca por uma brasilidade tropical dada por cores vivas e que é ilustrada através de narrativas mitológicas e exóticas. Seu olhar esbarra e dilacera justamente aquilo que se encontrava em estado de putrefação.


Sobre o livro “O universo de Francisco Brennand”
2012

Esta retrospectiva abre com um texto de autoria de Ferreira Gullar e um segundo de Alexei Bueno, um dos organizadores do projeto. Na sequência, fotos em alta qualidade mostram talvez o seu maior projeto, feito na arquitetura da Cerâmica São João, em Recife, fábrica um dia administrada por seu pai. Atualmente conhecida por Oficina Brennand, a série de edifícios se caracteriza por ser um work in progress de suas esculturas feitas através da cerâmica. Instaladas majoritariamente ao ar livre, estes trabalhos alteram o espaço originário e criam cenários permeados por formas fragmentadas, totêmicas ou, como o próprio artista diz, oníricas.


O fascínio pelo fim
2012

Através, portanto, do Apocalipse temos uma das diversas leituras que a ideia de “fim dos tempos” proporciona. O fim da existência de um espaço de convívio terrestre é já anunciado no fim singular de cada ser humano. A minha morte, então, já é um prelúdio do fim dos tempos, ou melhor, do fim do meu tempo. A cultura ocidental irá problematizar essa questão; se na Idade Média, havia espaço para os livros de oração, encomendados por integrantes de abastadas cortes e que proporcionavam uma disciplina espiritual, no mundo contemporâneo tudo é válido para que no dia do julgamento divino nossa alma vá para o céu – exorcismos, sessões de descarrego, penitências e dízimos seguem presentes tanto entre católicos, quanto em evangélicos.


Lampejo
2012

Ao percorrer os olhos sobre o trabalho de Felipe Abdala, dois dados chamam a atenção. Em primeiro lugar, temos a presença do desenho. A utilização do lápis, porém, não denota nenhuma aparente vontade de mimetizar o mundo e o corpo humano; o traço parece querer ser traço. Em uma parede, um conjunto de pontos o constitui, ao passo que ao seu lado a linha é constituinte de diferentes formas. Poder-se-ia falar sobre abstração numa leitura à chave dos escritos de Kandinsky, mas parece mais convidativo seguir as palavras do próprio Abdala quando diz que “ser um é ser muitos”.


Parafuso
2012

Os três artistas que aqui dialogam parecem estar em um local entre Michelangelo e Vesalius, ou seja, entre o martírio da carne e a experimentação anatômica. Se a dor é passível de interpretação em algumas dessas imagens, em outras os vasos sanguíneos são retas paralelas. Se, tal qual um parafuso, pudemos inseri-los dentro deste espaço, também é possível que os desprendamos dos lugares cômodos que o “corpo” proporciona na arte contemporânea. Mais do que prender, estes pequenos objetos talvez sejam importantes justamente pelo poder de desconectar.


Aqui é arte
2012

Enquanto Nazareth nascia, Bukashkin estava em efervescente produção artística. Se aproximadamente quarenta anos separam suas datas de nascimento, o mesmo não pode ser dito das imagens que produziram. Autorretratos estão presentes em ambos os trabalhos – no primeiro, através da fotografia e pela via da pintura no segundo. A escrita é outro elemento essencial. Bukashkin era um poeta e organizou livros de artista em que a relação entre imagem e texto é muito importante.


O adeus na esquina
2012

Essa exposição é sobre esquinas dobradas e cidades andadas, sobre se sentir distante e próximo da História, do urbanismo e, por que não, da mitologia. Podemos tentar representar os espaços pela pintura, desconstrui-los com quebra-cabeças, grafite e pedaços de papel. Lugares abandonados podem ser lembrados pela fotografia, monumentos podem ser inventados e árvores são a base para que linhas de lã criem mapas ficcionais.



Vanitas fotografada: considerações sobre fotografia e morte
2012

Que a proliferação de caveiras e outros símbolos vinculados à morte e à vanitas tenham voltado a proliferar na segunda metade do século XX – e particularmente a partir dos anos 1980 – é de todos sabido. De acordo com os curadores da mostra, o revival do tema relaciona-se, por um lado, à divulgação massiva e planetária dos grandes genocídios que, do Holocausto a Ruanda, marcaram o século; por outro, ao catastrofismo ecologista, o qual, a partir de uma lógica análoga à punitiva judaico-cristã, parece referendar o conceito segundo o qual o mundo irá acabar, e que a culpa é da humanidade; e, finalmente, às fantasmagorias que cercaram o surgimento da AIDS, autêntica peste negra que parecia punir justamente os piores pecadores: homossexuais, promíscuos e usuários de drogas.


Fábulas de Américas
2012

Os objetos mais complexos da exposição, porém, são os vídeos projetados em monitores que, inseridos na extensa quantidade de objetos espalhados pelo espaço expográfico, perdem um pouco de sua potência visual. Neles, a busca por uma identidade cultural se faz de modo menos óbvio - sabemos que são registros realizados durante a experiência artística andarilha de Nazareth, mas estas imagens se sustentam de modo mais existencial. Em “Cuando tengo comida em mis manos”, pássaros tentam pegar pedaços de pão jogados por suas mãos. A timidez dos animais dá lugar, rapidamente, a uma nuvem de aves que anseia por comida; o artista se aproxima do demiurgo.


Sem título
2012

A estrutura visual desta pintura frisa, em parte, o seu contorno, tal qual uma moldura. Poderíamos afirmar, então, que se por um lado este trabalho não é moldurado, por outro incita um retângulo sobre/dentro do objeto retangular. A cor preta que dá este efeito contrasta de modo pungente com um tom de rosa fosforescente. Impressiona o modo como esta imagem salta aos olhos dentro do espaço expositivo e me obrigou a voltar a ela mesmo que estivesse já do outro lado da sala, criando uma ansiedade em construir um inventário pessoal de apreensões em diversos ângulos.


A nobreza do canibalismo
2012

Com essa proposição de tomar posse daquilo que nos ameaça, é possível destacar dois filmes desta mostra. Em “O cozinheiro, o ladrão, sua mulher e o amante” (1989, de Peter Greenaway), o dono do restaurante em que a maior parte das ações se sucede, Albert Spica, é também o líder de um grupo de ladrões. Expansivo e opressor, o personagem atordoa a silenciosa figura de sua esposa que se demonstra incapaz de se colocar contra sua verborragia. Ao surgir a figura de um amante, Spica brada repetidas vezes: “Vou matá-lo e comê-lo” Garfo e faca são portados e sua vontade de canibalismo é teatralizada.


Quando a cozinha vira açougue
2012

Após as primeiras refeições, somos apresentados à rotina ausente de glamour da personagem: numa casa enorme e em reforma está presente também um marido que a trai com mulheres mais jovens. Saber sobre esse fato apenas contribui com sua ânsia pela juventude. Enquanto isso, a cozinheira é mostrada diversas vezes se deslocando entre Hong Kong e a China, sempre munida de uma pequena marmita. Curiosamente, a personagem passa por um hospital onde parece que foi buscar algo que daria sentido às suas viagens...


Maria
2012

O ponto de interesse, talvez, deste curta-metragem está justamente na resposta oral e rasteira desta humilde senhora; as lentes do homem de São Paulo puderam capturá-la em seu caminhar diário e mesmo transformar este encontro em cinema institucionalizado em festivais, mas ao mesmo tempo ela foi capaz de verbalizar sua discordância. Não, não trajava uma roupa "limpa e passada", como aquelas que julgava serem as ideais para um retrato. Em dado momento, diz "roupa para tirar retrato não é assim não, mas se quer tirar, tire", ou seja: visto que você tem essa arma mais forte do que eu, a câmera de vídeo, faça o que bem entender dela.


Máquina do tempo
2012

Pensando junto às obras de Gabriela Noujaim, a imagem da serpente que morde o próprio rabo e a necessidade de se olhar para trás para se produzir a arte de hoje. Passado, presente e futuro são problematizados dentro de uma pesquisa artística que tem a gravura, a fotografia e o vídeo, ou seja, a imagem técnica, como máquina do tempo.


Navegar não é preciso
2012

A contrastar com este poligonal acidente em um píer, uma estante abriga fileiras de garrafas de vidro. A organização é apenas aparente: preenchidas com água de rios da Paraíba, algumas possuem imagens de embarcações impressas em seu interior. O mofo dos barcos cede lugar ao papel que se desintegra pela ação da água. As garrafas viram miniaturas de oceanos e a história das navegações através da imagem se extinguirá.


“Todo o amor que houver nessa vida”
2012

Em uma noite de 2006, iluminados por luz artificial, mas ao centro de um modelo arquitetônico que um dia foi alvo para a luz divina, a Cia. Excessos realizou uma performance. Dois corpos pousaram sobre o coração do foyer do CCBB-RJ e sustentaram um beijo por meia hora. O ato afetivo que por si chamava a atenção pela centralidade espacial tinha um dado que saltava aos olhos: após constatar a diferença de alturas entre os indivíduos e considerar que o mais alto seria um homem e o mais baixo uma mulher (suspeita que se confirmava após um olhar mais detido), se percebia que uma curta saia xadrez era um elemento fora do conjunto.


Barulho
2012

Alteridade e união parecem palavras essenciais dentro da proposição do Opavivará! quanto à ocupação da Praça Tiradentes. Andar, cozinhar e lavar em conjunto... “Conjunto” de quem? Dos artistas e do “público”... mas quem são os artistas? As muitas cabeças que estão ali também na praça pública, agindo e deixando agir, sendo ligeiros protagonistas e, talvez melhor, mais um elemento coadjuvante ou figurante dos grupos dispersos de pessoas que se formam às quartas e sábados neste espaço.


Repouso
2012

As polaroides de Andy Warhol são como estes calçados com salto alto: elevam o status das imagens registradas, as alavancando como arte emoldurada tal qual um altar faz com um objeto sagrado. Todos estes nomes, porém, serão esfaqueados pela malícia do tempo e da História. A queda do salto é certeira e    só restará o repouso - tão silencioso como uma fotografia.


Desbotar
2012

Poderia haver futuro nesta relação rápida? Leo Ayres indica que talvez sim, visto as pequenas luzes que ainda estão acesas. O sol diário se sobrepõe a elas, mas é incapaz de destruí-las. Apenas o tempo será capaz de responder e nunca de modo certeiro.


A reencarnação de Santa Orlan” e o martírio do corpo feminino
2012

“Carnal Art” é um projeto que está diretamente relacionado com a tradição do auto-retrato, como a própria artista também afirma. Dialoga com obras de diferentes pintoras, numa faixa que pode incluir de Sofonisba Anguissola até Cindy Sherman. Séculos de preconceito contra a produção artística das mulheres devem ser revistos quando uma artista como Orlan retira o seu corpo, o corpo feminino, do silêncio da preconceituosa sociedade artística e o coloca como objeto central de suas performances, o violando, o cortando, o repaginando.


“Call girl”
2012

“Slovenian girl” se interessa pelos microuniversos que podem vir a ser encontrados na Eslovênia contemporânea. A guerra e a Iugoslávia enquanto tópicos sequer passam perto desta narrativa que, em contrapartida, mostra um processo de “internacionalização” do país. Não à toa, a “eslovena” do título cursa uma graduação em inglês e tem uma clientela majoritariamente estrangeira. Poderíamos interpretar esse dado como uma metáfora para a posição que o país ocupa atualmente, ainda marginal quando pensado em relação à Europa enquanto território e constructo cultural?


Óleo sobre tela
2012

A pergunta que fica, por outro lado, é: qual o lugar da pintura no cenário artístico contemporâneo? O que poderia ser produzido após o seu pretenso “esgotamento” junto ao expressionismo abstrato de Jackson Pollock e seu “retorno” (frisado e talvez mesmo inventado pela crítica) durante a década de 1980? Muitas são as respostas possíveis, diversos são os pincéis ativos atualmente. Alguns deles estão nas mãos de Clarissa Campello.


Prudência
2012

As bordas de uma imagem fotográfica e as linhas que contornam os espelhos: polígonos. No seu entorno, dois elementos cujo domínio pelo viés da geometria foi tentado à exaustão em séculos de produção de imagens: o corpo humano e a paisagem. Se em sua autoimagem o artista se encontra parcialmente “ao léu”, desnudo, o mesmo não pode ser dito quanto à sua proposta poética.


Ligar os pontos
2012

Caravaggio, Beuys, Godard, Warhol, Grünewald e a perspectiva embaçada por Virgílio Neto. Não temos aqui uma divisão clara entre essas diversas tradições; clássico, moderno e contemporâneo estão sob o mesmo estatuto, ou seja, são arte. Os grandes nomes por ele citados já passaram pelo seu processo de institucionalização e foram catalogados nos livros de Argan e Gombrich. Seu esforço se baseia em recosturar essa história evolutiva e linear da arte, picotando as páginas destas bíblias acadêmicas e jogando-as do ar como num pega-varetas. O ponto de vista é o da “história” com agá minúsculo, o do embate desse indivíduo com estes objetos aurificados.


1,04 centímetros
2012

Os trabalhos aqui mostrados de Felippe Moraes parecem lidar com esse centímetro de respiração, ou seja, versam sobre os abismos invisíveis entre os números e sua falsa segurança. Em “Chão medido” e “Homenagem a Pitágoras”, através da fotografia em preto-e-branco, pequenas narrativas são criadas a partir de um campo. Se Albrecht Dürer se utilizou da gravura para mostrar ao espectador diferentes modos da medição do corpo humano, Felippe Moraes lança mão da reprodutibilidade técnica para refletir sobre a relação entre geometria e espaço físico.


Olhe para o meu boné
2012

“Mantenha o corpo reto”, ele diz. Ajusta a lente e depois pede: “Agora olhe para o meu boné”. Claro, como poderia ter uma imagem minha iluminada pelo olhar seguro de Cícero evitando o contato direto com o espectador? Na simulação de sua postura confiante, duas poses são tradicionalmente possíveis: em uma foto ergo a minha mão direita, como se tocasse o homem santo. Na outra, me coloco abaixo dele e sou abençoado. Em dez minutos elas já estão impressas, portadoras de bordas verdes e de um texto que não deixa dúvidas de que estes retratos foram produzidos em Juazeiro do Norte em data específica.


Azul, cinza e dourado
2012

Três são as cores que podem definir a última exposição da Temporada de Projetos 2011 do Paço das Artes, em São Paulo. O azul de Daniela Seixas, o cinza de Ivan Grilo e o dourado de Felippe Moraes.


Vórtice
2012

Oito fotografias horizontais se encontram ladeadas dentro do Centro Cultural São Paulo na exposição “Da natureza”, de Lívia Aquino. Ao caminhar, percebemos um número maior de paisagens tropicais que acompanha algumas imagens mais áridas. Deserto, canyon e cacto podem ser tidos como contraposição ao verde, cipós e raízes proeminentes. Diferente do que esta descrição pode fazer parecer, não se tratam de registros fotográficos daquilo que foi criado pela deusa Gaia (ou pela Mãe Natureza); três dados se apresentam dissonantes.


Abraçar o capeta
2012

Esse extenso número de amarras dos polvos também pode ser comparado metaforicamente às cordas que sustentam uma marionete. Não à toa, em diversos momentos do clipe, luzes, tal qual lasers, saem do corpo de Fiona Apple. No lugar de controlar seus movimentos, estas cordas se projetam pelo espaço como um asterisco deixando suas pontas soltas para que o espectador as una de algum modo ou creia em uma espécie de aleatoriedade “surreal” quanto à captura e edição de imagens.


Vermelho terra
2012

As vísceras de uma “lady in red”, onde a dama está mais para femme fatale. Em vez de buscar o glamour que a cor poderia oferecer, mais apropriado é um tom de vermelho terra que nos coloca em uma relação instintiva e, nesse sentido, “primitiva” no embate entre o outro e nossas pulsões.


Devaneios
2012

A Casa França-Brasil acolhe até o dia 8 de julho a exposição “Miragem”, de Regina de Paula, dentro do Projeto Cofre. Ao mirarmos o pequeno cofre desse prédio que já foi a Alfândega, constatamos que o espaço para entrada do corpo dos espectadores está ainda mais restrito que o habitual – nos resta um semi-arco onde três pessoas já são uma multidão. A instaurar esta forma, uma chapa de acrílico que protege um monte de areia de 1,45m de altura.


O pitoresco mora ao lado
2012

“Viagem pitoresca através do espaço ao redor da minha casa” é o título deste trabalho de Daniel Caballero. Não se pode mais falar num “Brasil”, tal qual Rugendas o fez em seu álbum de imagens, em 1835, assim como não é possível dar conta da diversidade paisagística de São Paulo. Por outro lado, é possível compartilhar a apreensão daquilo que está ao redor de nosso ninho e codifica-lo em visualidade. Transformar suas gambiarras em arte é iluminar não só as precariedades de outras cidades pelo globo, mas nos fazer refletir sobre o frágil e provisório entre e dentro de nós mesmos. O pitoresco mora ao lado.


A tragédia da serenidade
2012

De Chirico me deixa com mais perguntas do que respostas e o tom misterioso, quase noir, de algumas de suas pinturas me desconcerta e torna vão qualquer esforço interpretativo por engaveta-lo historiograficamente. Como ele mesmo escreve no manifesto “Sobre a arte metafísica”, de 1919, “A questão da compreensão nos preocupa muito hoje; amanhã ela já não perturbará mais. Ser ou não ser compreendido é um problema de hoje”.


Alquimia
2012

Os alquimistas medievais buscavam a “pedra filosofal” e com ela seria possível, por exemplo, fabricar um elixir da vida capaz de garantir a eternidade. A poética de Anton Steenbock aponta para o lado inverso: a arte, a vida e as velas são efêmeras e se autodestroem aos nossos olhos. Esta mesma pedra seria capaz de transformar alguns metais em ouro, do mesmo modo que o artista recodifica objetos comuns em arte e aciona em nossas memórias imagens que vão desde pinturas que representam laboratórios de alquimia à famosa abertura do programa infantil de TV “Rá-Tim-Bum”.


Bienais e o “sul do Brasil”: modos de discurso
2012

Dois grandes eventos de arte contemporânea que acontecem a cada dois anos. Setecentos quilômetros de distância e quase dois meses de acontecimento simultâneo. Visitar uma destas bienais era quase que um convite a prolongar a viagem e entrar em contato com a urbanização e expografia de outra capital do sul do Brasil. Em cada local um recorte temático diverso, inserido em espaços institucionais igualmente variados.


Em se plantando, tudo dá
2012

Sonia Andrade se serve de uma série de alimentos de modo gradual. Com uma concha inicia por colocar feijão em seu prato e misturá-lo com pão. Enquanto observamos este banquete protagonizado por uma mulher, temos a recodificação de uma construção histórica dos papéis da mulher, ou seja, em vez de se colocar a cozinhar para um homem, para o “sexo oposto”, podemos concluir que a artista, cozinhou e serve a si mesma, central e solitária à composição da imagem.


(Des)encontros ao redor de uma mesa
2012

O restaurante se transforma em um arquipélago: cada mesa, cada refeição é uma ilha. Temos a confiante e autossuficiente mulher de negócios que, na ausência de parceiros de mesa, fala ao celular; uma família desestruturada se encontra após anos de ausência; uma família oriental fotografa os momentos de exotismo cultural italiano com sua Polaroid; dois amigos atores ensaiam e debatem sobre uma peça de teatro. Destacando-se do extenso elenco de atores, como reis e rainhas deste grupo de pedaços de areia sobre o mar, quatro rostos conhecidos dentro da produção de Scola: Fanny Ardant, Giancarlo Giannini, Stefania Sandrelli e Vittorio Gassman.


Objetos
2012

Uma casa construída no século XVIII. Uma exposição de arte contemporânea. De qual forma seria possível ocupar este espaço, agora público, mas um dia residencial? As artistas Daniela Seixas e Mariana Katona Leal optaram por tomá-lo tal qual uma casa de família, espalhando aquilo que possivelmente saturava o espaço interno desta arquitetura colonial: objetos. O local, que um dia foi tomado por robustos móveis de madeira, agora será permeado por outra categoria de objetos, os artísticos, que incentivam e pedem que o amplo espaço da arquitetura desta construção respire e permita ao visitante a possibilidade de enfrentar o espaço vazio.


Passagem
2011

De todo modo, podemos comparar este objeto artístico, poeticamente, a um relógio e, para ser mais preciso, a uma ampulheta. Milton Marques cria um objeto de indício horizontal da passagem do tempo. Areia cobre esta superfície circular. Sobre a roldana de um dos elementos há um relevo com a frase que intitula o trabalho, “o esquecimento é destruir, não construir”. Com um mecanismo elétrico ligado, um movimento curvilíneo se inicia sobre a areia. Palavras são desenhadas sobre o plano. Enquanto isso, logo ao lado, o outro ponteiro limpa o recém-escrito.


Pastar
2011

A paisagem das vacas serializadas de Luciano Boletti é a própria tinta do cubo branco. O que aconteceu com o entorno? Comido foi por estes animais? As cavernas de Altamira e Lascaux foram atualizadas e substituídas por um espaço institucional da arte contemporânea. A monocromia de cada vaca é composta por diferentes representações de objetos e letras. Desta forma, estes carimbos, típicos do universo infantil e do início da construção da relação entre signo, significado e significante, dão o contraste de cada vaca com o “vazio” da superfície que realça a sua potência.


Música, comida e apodrecimento
2011

Em maio de 2006, a dupla de música eletrônica inglesa Simian Mobile Disco lançou o single “Hustler”, extraído de seu álbum de estréia “Attack Decay Sustain Release”. Com a música, como de costume no mercado fonográfico desde os anos 80, veio um videoclipe. Nele, um grupo de jovens mulheres brinca de telefone sem fio, ou seja, cada uma cochicha no ouvido da pessoa ao lado alguma coisa. A câmera, ao centro deste círculo, passeia pelos seus corpos e cria uma idéia de ciclo. Dos susurros apagados pela frase repetida “I’m a hustler baby, that’s what my daddy’s made me” para o encostar dos lábios que se transforma em carícias, lambidas e beijos.


... e você não ficou
2011

É sobre este tópico que versa o novo filme de Eduardo Coutinho, “As canções”, projetado recentemente no Festival do Rio, onde ganhou o prêmio de melhor documentário. Uma cadeira e cortina pretas, uma pessoa sentada de frente para a câmera e o diretor ao lado, fora do enquadramento. Apenas o essencial é demonstrado enquanto imagem: o elemento humano, sua voz, sua expressividade e os pitacos do entrevistador. Os entrevistados cantam músicas que marcaram suas trajetórias e tentam explicar para Coutinho o contexto destas lembranças.


Fazendas
2011

Uma série de imagens sem título. Pinturas? Não em seu sentido estrito, visto a utilização do grafite, material-pai do desenho. Telas em escalas grandes, acima de um metro de extensão. A repetição de uma mesma figura bovina em amarelo e em preto. Se um dia a pintura de Luciano Boletti saturava o espaço bidimensional, hoje dá lugar à exploração de seus trechos vazios; da soberania do preenchimento para a solidão dos contornos. A cor uma vez dotada de sustância agora é respingada ou escorrida pela superfície da tela.


Uma gravura de Honoré Daumier
2011

Uma movimentação intensa de linhas. Diversas direções, diversas espessuras, diversos preenchimentos. A litogravura de Daumier mais parece um desenho a lápis-de-cor preto, tamanho a destreza com que as mãos do francês trabalham sobre o espaço do papel. Nenhum contorno das figuras é eternizado; estas possuem uma tensão, parecem estar a se desfazer – se assemelham a uma animação em movimento 2-D. O espaço do Salão representado é todo rascunhado. As molduras ao fundo são meras molduras, cujas pinturas evaporam devido à justaposição de planos das figuras que estão à frente.


Torto
2011

Ao observar os quadros produzidos por Clarissa Campello, é possível refletir sobre sua relação com a tradição clássica. Temos aqui “Retratos”, tal qual o título da exposição, mas seriam eles produzidos como essa doutrina artística? Há o formato da encomenda, mas o processo se dá de modo diverso, ou seja, os comanditários enviaram para a artista retratos (ou autorretratos) fotográficos. Esta selecionou aquele que mais a agradou e, de dentro de sua casa, estabeleceu um embate com a imagem.


A gaita e a permanência
2011

Falar sobre cinema na República Tcheca remete de modo inevitável à minha infância. Tinha cerca de seis anos e estudava pelo turno da manhã. Como quase toda criança dos anos 90, geração pré-internet, uma boa opção para diversão era assistir a desenhos animados na pequena tela de casa. Após o almoço, passava parte da tarde a assistir um programa infantil muito famoso no Brasil, o Glub Glub, exibido na TV Cultura.


Francisco de Holanda: uma revisão historiográfica
2011

E este é o primeiro parecer quando nos deparamos com as duas vertentes de abordagem de Diálogos em Roma: a figura de Francisco de Holanda fica obscurecida, e todo o debate enfoca a inclusão de Michelangelo em suas argumentações. Seus outros textos não são citados, e os historiadores lançam seu olhar para a escrita portuguesa apenas por conta da fatídica “presença” de Buonarroti; o texto vira trampolim para se interpretar a arte do dito “Alto Renascimento”, ou seja, a arte produzida por Michelangelo e outros durante o século XVI e na Itália.


De Akehnaton a Duchamp: arte, transexualidade e androginia
2011

Ainda no campo da criação fotográfica, temos Andy Warhol e sua série de autoretratos em Polaroid enquanto travesti. Sem sinal de seios, em algumas fotos mesmo portando uma gravata, Warhol representa-se a si mesmo com um vermelho nos lábios que contrasta tanto com sua pele, quanto com seu cabelo já senil, e o próprio branco que dá a base efêmera de uma fotografia Polaroid.


If you fuck with the bull, you get the horn
2011

Uma paisagem, um trem e a frase acima. Traduzindo para o português, poderíamos interpretá-la, literalmente, como “se você fode com o touro, ganha o chifre” ou, “se você mexe com o touro, você é chifrado” Deste modo, somos introduzidos a Mala Noche, longa-metragem de 1985, dirigido por Gus van Sant.


Krtek e o universo ao redor
2011

Ao se caminhar pelo centro histórico de Praga, capital da atual República Tcheca, é difícil não perceber a proliferação de souvenirs de Krtek: fantoches, marionetes, ímãs de geladeira e até mesmo ioiôs são vistos à venda. Trata-se de um personagem que pode ser tido como símbolo da cultura tcheca; temos aqui mais um marco dentro de certa tradição do desenho animado encontrada neste país.


As tentações do Doutor Antônio (Federico Fellini, 1962)
2011

Roma, década de 60. Jovens, o Cinecittà no seu auge e a explosão internacional da commedia all’italiana. De forma rápida, é deste modo que Fellini dá o tom introdutório do seu média-metragem “As tentações do doutor Antônio” (“Le tentazioni del dottor Antonio”), de 1962, inserido dentro do longa-metragem episódico “Boccaccio 70”. Como o seu título aponta, esta reunião de médias, que também contou com as mãos de Mario Monicelli, Luchino Visconti e Vittorio de Sica, trata-se de uma série de pequenas histórias em que o moralismo às avessas do “Decamerão” se faz presente.


A grande onda
2011

Na parte de baixo da imagem central de “Pintura antifurto” o contraste se dá de modo pontual: pequenas “manchas brancas” ao lado daquilo que realmente é a área manchada; acima, um contraste mais intenso dado pela extensão contínua de branco. A areia molhada pelo encontro da água e uma grande onda que se anuncia entre o horizonte e a margem. Micos deixam de ser dourados, onças tem suas pintas apagadas. Não há mais espaço para a apreensão tranquila da Baía de Guanabara. É preciso nadar contra a maré, subir nesta grande onda e impedir que ela se transforme em um maremoto social.

Gabinete e perenidade
2011

Dois desertos. O deserto criado por Leila Danziger através da transformação da matéria em pó. Nelson Leirner e o banal que vira matéria através do excesso oferecido no SAARA; não o deserto, mas o mercado popular do Rio de Janeiro. Duas interpretações diferentes do gabinete de curiosidades rumo a um gabinete de perenidades.


Saliva, suor e lágrimas
2011

“Weekend” (2011), de Andrew Haigh. Melhor: “weekend”, como o próprio filme faz questão de frisar em seus primeiros minutos. Um final de semana, uma semana e um fim. Dois homens, pelos, barbas e o “gosto de pau e bunda”, como um deles diz. Um salva-vidas que parece mais conduzido do que condutor de sua existência. Maior estatura, traços anti-clássicos e silêncio. Uma ponte. Do lado de lá, a brancura da pele, a verborragia e os pés que devem ficar em sua ponta para alcançar o beijo. Um artista, sua experiência no universo gay e o excesso de certezas.


Descansar jamais
2011

"Trabalhar cansa", portanto, versa também sobre esta problemática relação entre o ser humano, a disciplina e seu entorno; é possível controlar tudo à nossa volta? Quais os limites do controle, da vigilância e da punição? Estes tópicos já apareciam, de certo mundo, no curta-metragem também dirigido pelos dois diretores, "Um ramo", de 2007, que tinha a mesma atriz, Helena Albergaria, no papel central. Tratava-se de uma mulher que se deparava com o nascimento de uma planta em seu corpo.


Tatear o mundo
2011

Vinte e dois artistas exibiram seus trabalhos dentro da exposição Novíssimos, realizada no Rio de Janeiro, na Galeria de Arte IBEU, entre os dias 28 de julho e 2 de setembro. Como o próprio nome anuncia, o evento (nem tão novo, já na sua 41ª edição) tem por objetivo exibir produções de “novas gerações” de artistas contemporâneos, não exatamente no que diz respeito à sua faixa etária, mas sim ao caráter de “novidade” no contato com a instituição galeria/museu.


Minhas mãe e meu pai (Lisa Cholodenko, 2010)
2011

O argumento é simples e já conhecido: inseminação artificial, filhos e a curiosidade em torno da figura paterna. O diferencial? Aqui não há o protagonismo de uma mãe solteira, como no clássico da Sessão da Tarde Feita por encomenda, de 1993, com Whoopi Golderg. Temos duas mães aqui e nada solteiras. Trata-se de um casal gay que resolve engravidar individualmente, mas do mesmo doador de sêmen. E não são duas mulheres quaisquer; Annete Bening e Juliane Moore levam o filme sobre as suas costas do começo ao fim.



Considerações acerca da fortuna crítica de Tiziano Vecellio na Península Ibérica durante o século XVI
2010


O pintor português inverte o posicionamento do corpo e das mãos de D. Sebastião, neto de Carlos V e D. João III e rei de Portugal entre 1568 e 1578. Pintar o rei de Portugal de forma semelhante ao, um dia, imperador do Sacro Império Romano-Germânico, seu avô, é tentar, através da imagem, criar uma continuidade da iconografia da família. O que torna este exemplo ainda mais interessante, é que esta tentativa bem-sucedida também acaba por perpetuar uma tradição artística, impulsionada pelos personagens aqui já frisados, tais como Tiziano Vecellio, Pietro Aretino, Francisco de Holanda e Anthonis Mor.


A ronda noturna (Peter Greenaway, 2007)
2010

Mais uma vez a formação e obsessão de Peter Greenaway pelo campo das artes plásticas (especificamente da pintura) é o que dá imagem, texto e contexto a uma obra cinematográfica de longa duração. Em “A ronda noturna”, como o título aponta, temos uma releitura/adaptação do retrato pintado em 1642 por Rembrandt van Rijn, em que representa um grupo de militares liderados pelo capitão Frans Cocq.


Martírios do corpo feminino: Orlan e Hannah Wilke
2010

Diversas são as acepções para a palavra “dor”. Duas delas são de interesse para o presente texto: “sentimento que surge em decorrência de dano causado a outrem ou a si mesmo; arrependimento, pesar, remorso”; “sentimento de pena com relação a outrem ou a si mesmo; compaixão, dó”. As artistas contemporâneas Orlan (1947-) e Hannah Wilke (1940-1993) respondem dentro do campo das artes visuais ao problema estabelecido pela relação entre corpo, mulher e dor. Ambas trabalham com sua própria imagem física, exposta ao julgamento do espectador e seus corpos recebem intervenções de diferentes formas e finalidades.


Resenha de “Food in painting: from the Renaissance to the present”
2010

Gula e luxúria, comida e sexo são itens que caminham lado a lado. Seria aleatório o fato de em algumas representações de mercados fartos observarmos ali ao lado a presença de uma figura feminina que desafia o espectador? Haveria certo sexismo neste modo de representar? E os duplos sentidos que envolvem as palavras do campo semântico da comida e do comer? Como o autor esclarece, não só em português eles se fazem presentes, mas em diversas línguas ocidentais.


Nome e sobrenome
2009

Benjamin Button, Amélie Poulain, Forrest Gump – não se tratam de meras coincidências. Quando perguntavam o que achei de “O curioso caso de Benjamin Button” a cruel resposta que dava era “um misto de Forrest Gump com Amélie Poulain”. Não foi grande a minha surpresa ao descobrir, dias depois, que o roteirista do primeiro (Robert Zameckis) é o mesmo do filme dirigido por David Fincher.


Sobre o É Tudo Verdade 2009
2009

Esta foi minha primeira experiência com o famoso festival de documentários É tudo verdade, realizado em terras cariocas entre 26 de março e 05 de abril. Duas sessões e apenas nove curtas-metragens nacionais em competição. Sete produções do sudeste (Rio, Sampa e Minas), uma de Brasília e outra de Pernambuco. Devido a este restrito número de curtas, parece mais adequado fazer comentários individuais e, como me foi sugerido após uma leitura de meu texto anterior, respeitar os programas montados pela curadoria e sua seqüência de filmes.



Retrato
2009

Retrato e memória caminham juntos e estão baseados na relação entre quatro pontos: o retratista, o retratado, o comanditário (aquele que encomenda a imagem) e, por fim, a finalidade do mesmo. O retrato tem o seu público-alvo; desde as estátuas romanas de imperadores como Júlio César (100-44 a.C.), passando pelas miniaturas com cunho de lembrança particular, como na corte de Elizabeth I (1553-1603) ou com o advento da fotografia digital. A sua visualidade é proporcional ao seu futuro espaço expositivo público, particular ou mesmo em ambas as instâncias.



Arte e transexualidade
2009

No campo das artes visuais, a tensão entre os sexos em um mesmo corpo foi representada das mais variadas formas. O faraó egípcio Akhenaton, servidor de Aton (a manifestação esférica do deus-sol Rá), é representado em uma série de esculturas como uma figura andrógina, com o corpo construído por curvas sinuosas. Tal opção parece justificável devido à compreensão de Aton como “pai e a mãe de todas as coisas”, ou seja, uma relação entre divindade e ambivalência sexual, absolutismo no poder político e religioso. Aqui, androginia se associa a poder.


Retrato e auto-retrato em Nikki S. Lee
2009

Presente nos Estados Unidos desde 1994, a artista desenvolveu uma série de trabalhos intitulada “Projetos”, a partir de 1997. Grosso modo, ela observa o comportamento de um grupo de pessoas culturalmente estereotipadas. Em seguida, modifica seu próprio visual, a fim de tornar-se mais um elemento no conjunto: adquire roupas nas mesmas lojas, modifica seu cabelo, ganha ou perde peso. Por fim, interage com eles, em todos os sentidos do termo, por cerca de três meses. Estes retratos fotográficos são os produtos destas vivências de Nikki.


Quando a geografia é um detalhe
2009

Quatro realizadores, diversas obras audiovisuais e uma possível constância geográfica: Minas Gerais. Não, não apelarei para o discurso da "mineiridade" (que às vezes tem nas entrelinhas aquele outro péssimo discurso da "brasilidade") tão comentado, criticado e revisto por autores como Mário de Andrade, Frederico Morais, dentre outros. O que rascunharei aqui são algumas observações feitas a partir da apreciação dos vídeos selecionados por estes quatro jovens realizadores para suas próprias sessões. Enquanto os assistia, constatei que existem diálogos para além da geografia entre as suas obras; alguns tópicos insistem em aparecer nas suas poéticas e são trabalhados formalmente de modos variados.


Sobre o 1º Festival do Júri Popular
2009

Sigo na árdua missão de refletir criticamente sobre os festivais de cinema no Brasil. Diferente dos outros dois brevemente analisados (o de Juiz de Fora e o realizado em Campinas), nosso exemplo atual é poligeográfico. Além disso, debuta dentro do quadro anual de eventos de cinema. Trata-se do Festival do Júri Popular, cuja sede é a cidade do Rio de Janeiro, mas com sessões espalhadas por mais de 18 capitais brasileiras.


Alemão e inglês
2009

“Bagdá Café” é um filme que pode começar a ser analisado em torno do número dois. Temos duas palavras em seu título, que apontam para dois macrocosmos: geografia e alimentação. Dentro da narrativa fílmica encontramos duas mulheres que podem ser interpretadas como as personagens principais. Uma gorda, uma magra. Uma branca, uma negra. Uma delas advém da Alemanha, a outra metralha palavras exaltadas em inglês. É sobre quando os dois tornam-se um (sem conotações sexuais, por favor).



Sobre filme, olhar e liberdade
2009

Sou calouro dentro da curadoria da MFL. Trabalho com as mesmas queridas pessoas há seis anos, mas anteriormente me detinha à produção dos panoramas e do seu processo de inscrições. Desde sempre, ao comentar sobre a existência da mostra, os ouvintes atentos têm o costume de imediatamente perguntar: “O que é um filme livre?”. No lugar de ter uma resposta pronta e que fecharia a questão, indico a estes que leiam os diversos textos espalhados pelos oito catálogos anteriores a este e que possuem visadas diversas sobre esta definição.


Sobre a 3ª Mostra Curta Audiovisual
2008

O festival contou com duas salas de exibição. A primeira, simpática e com uma boa qualidade de projeção, no MIS (Museu da Imagem e do Som) de Campinas. O outro espaço, um dos auditórios do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da UNICAMP, apresentou uma série de problemas, principalmente no que diz respeito ao áudio dos vídeos projetados, o que comprometeu a fruição de algumas obras. Outro dado relativo a este espaço e que merece ser lamentado era o esparso público presente; cheguei a assistir a mais de uma sessão sozinho no espaço.


“Do tirar polo natural”: relações possíveis
2008

“Do tirar polo natural”, pelas análises aqui rascunhadas, trata-se, portanto, de importante texto dentro do ambiente artístico do Renascimento em Portugal. Primeiramente, pelo seu aparente ineditismo no que diz respeito ao exclusivo tratamento dado à teoria do retrato. Em segunda instância, mas de nenhuma forma menos importante, pela capacidade de poder ser relacionável tanto à produção de retratos de Francisco de Holanda, em que não encontramos uma correlação clara com suas palavras, quanto pela série de cruzamentos ainda a fazer entre o texto e os retratos portugueses produzidos durante o século XVI.


“Losing my religion”
2008

Em “Wall-E”, o personagem-título está responsável por organizar o lixo que restou de nosso planeta, de forma mecânica, porém sensível, percebida, por exemplo, no reaproveitamento de objetos que ele encontra em seu trabalho. Há um processo de curadoria, uma seleção que o pequeno robô faz dentro do lixo; algumas coisas precisam ser recicladas, outras, permeadas pela presença da memória e afeto de outrem – um cubo mágico, um filme, uma música – merecem permanecer em seu pequeno museu-casa. Por outro lado, o dia-a-dia demonstrado em “Ensaio sobre a cegueira” assemelha-se ao do espectador: refeições, engarrafamentos, idas à farmácia.


Quizás, talvez, perhaps...
2008


Wong Kar-Wai tem uma poética permeada por nós e, sutilmente, deixa-nos a opção de desatá-los. Ou então podemos seguir fruindo seus planos sem tentar também dominar os significados destas cores vivas, destas bruscas mudanças de velocidade das imagens, destes ângulos agudos e destas trilhas sonoras com canções as mais diversas, escolhidas a dedo. Pois, pensando bem, da mesma forma que esses personagens vagam com suas ausências, não seriam estas imagens tomadas por uma imanência, sem qualquer necessidade de transcendências alegóricas?



A gula como problema artístico
2008


Peter Greenaway costuma dizer que não é cineasta; prefere ser tratado como um pintor que faz filmes. Em diversas entrevistas consultadas, o britânico possui uma postura severa para com a produção americana, chegando a afirmar que seus diretores “... não entendem sobre o que se trata de fazer metáforas em cinema. Eles são extremamente bons em fazer filmes corretos, com narrativas lineares, que entretém soberbamente. Mas eles muito raramente fazem alguma outra coisa”.  


Sobre o azul
2008

O “Grande panorama de Lisboa” é o cartão de visita de outro panorama: o da relação entre Portugal e a produção artística com azulejo. É ponto comum na historiografia afirmar que em terras lusitanas existe uma longa tradição no lidar com a azulejaria. Parece ser mais interessante lermos esta exposição de uma outra forma, a partir das relações possíveis destas imagens apresentadas com um leque de fluxos artísticos presentes não apenas no que diz respeito à azulejaria, mas sim à arte em Portugal como um todo.


Sobre o Primeiro Plano - Festival de Cinema de Juiz de Fora e Mercocidades
2008

Um significativo diferencial desta edição para as outras é a inclusão de filmes realizados em vídeo, o que possibilita, em teoria pelo menos, uma diversificação ainda maior do leque de propostas audiovisuais de diretores estreantes. Como já se pode ter pensado, o tamanho dessa janela de exibição (31 curtas) acaba sendo menor do que a de outros festivais, justamente devido a esse recorte temático voltado às estréias. Coroando a bacana proposta está a geografia: a cidade de Juiz de Fora, pequena e recheada de um público que responde de forma animada às quatro sessões competitivas de curtas no histórico cinema Cinearte Palace.


Leituras da gula: “O cozinheiro, o ladrão, sua mulher e o amante” (1989), de Peter Greenaway
2008


Ao escolher “O cozinheiro, o ladrão, sua mulher e o amante”, de Peter Greenaway, foi preciso também escolher qual a melhor forma de analisá-lo. Parece-me que a melhor forma de fazê-lo é conjugar tanto as reflexões em torno do que ele teria de “essencialmente” cinematográfico, ou seja, a sucessão das imagens, quanto analisar framesespecíficos, como se fossem fotografias ou até mesmo pinturas, pensando a construção das imagens sem obrigatoriamente conjugá-las com as tomadas de postura ditadas pela montagem.


“Do tirar polo natural” e o retrato em Portugal
2008


Que indivíduos são merecedores de ter sua memória perpetuada? De quais formas deve o artista retratista lidar com o seu querido/temido retratado? Quais as condições ambientais necessárias para que o retrato realizado tenha uma garantia de boa qualidade?


Mário de Andrade e a institucionalização das artes plásticas: Anita Malfatti, Lasar Segall e Cândido Portinari
2008

Ao princípio, Anita Malfatti e um crítico que inicia suas reflexões sobre as artes plásticas; na seqüência, Lasar Segall, um estrangeiro no Brasil, lido por Mário como um pesquisador das “cores tropicais”; por fim, Portinari e o seu celebrado ”dever social”, bem visto pelo escritor paulistano. Ao lidarmos com essas três figuras do cenário artístico nacional, em relação com Mário de Andrade, acabamos por criar um parecer também sobre o que pode vir a ser “história da arte” pela ótica deste.


Vanitas
2008

Parece que muita gente já viu "Piaf - um hino ao amor". Meus amigos fizeram os mais variados comentários sobre o filme. Ponto comum entre suas observações era a presença das lágrimas.


Entre assassinatos: Oskar Kokoschka
2007


Lidar com a obra de Oskar Kokoschka (1886-1980) é como pisar sobre ovos. O artista é tradicionalmente vinculado à produção da “arte moderna”, estando geralmente associado aos expressionistas alemães. Devemos inicialmente nos perguntar sobre o significado deste termo, “arte moderna”, tarefa árdua e ingrata, que visa mais o levantamento de questões do que qualquer tentativa de resolução definitiva de problemas para o campo da arte.


Sobre exibir filmes e liberdade: a árvore e a girafa
2007


Proponho-me a analisar brevemente o discurso curatorial da Mostra do Filme Livre, evento realizado há seis anos, em terras cariocas. Antes de deter-me sobre este, faz-se necessário um pequeno histórico desses essenciais espaços para a divulgação de obras audiovisuais, além de deixar registrada a quase inexistência de material bibliográfico crítico e nacional sobre a realização dos mesmos.


Lasar Segall - corpo presente
2007


Junto aos muito comentados nomes de Anita Malfatti e Tarsila do Amaral figura este homem não-brasileiro, dito como mais um "mestre do modernismo no Brasil" - seja lá o que isso for. Esta mostra de suas obras faz-se importante quando temos em mente que grande parte de sua produção está no museu que leva seu próprio nome, em São Paulo. Foi uma boa oportunidade de ter um contato direto com suas pinceladas, desenhos e gravuras, refletindo sobre os muito comentários lidos sobre sua obra e verificando se nossas considerações sobre suas reproduções batem com nossos pareceres perante os originais.


Morte
2007


“Verão” surpreende já pela segurança com que as imagens são apresentadas. Trata-se de um filme universitário, uma produção da FAAP que diferentemente de muita coisa produzida em escola, não apresenta nem um descaso para com a realização da obra, nem uma vontade de ser monumental e maior do que o espaço da tela de projeção. Ele segue o caminho do meio – a grandiosidade na simplicidade da construção dessas imagens.


Recreio
2007


Um dos mais belos momentos desse filme e da Curta Cinema é quando a professora blefa e diz aos pequenos que naquele dia não haveria “pátio”, ou seja, recreio, devido ao seu mau comportamento. Após tanta dedicação a uma aproximação ao universo de Quintana, os pequenos discutem com a mestra, tentando colocar seus diversos pontos de vista sobre a bagunça precedente. No fim das contas, eles são liberados e correm, e muito, para a portinha que liga a escola ao seu quintal. É uma das imagens mais belas (além do caráter estético) por conjugar duas questões.


Na trave
2007


Continuando minhas reflexões em torno de apelidos para filmes e sessões, parto agora pra algo visto hoje no Odeon. “Sensações contrárias” merece o rótulo “na trave”. Aliás, essa classificação caberia a alguns outros curtas assistidos no festival, os quais ainda não cogitei escrever textos. No caso desse filme baiano, meu incômodo foi imediato, sincronizado às imagens que iam brotando na telona do cinema.


“Do tirar polo natural”: considerações sobre a teoria do retrato em Francisco de Holanda
2007


A indicação de melhor forma de se pintar o rosto, de forma “treçada” (que poderíamos ler como “recursada”) e inclinado à mão direita, não está presente; pelo contrário, Holanda realiza o retrato de perfil, forma que ele mesmo critica em seu capítulo “Do escolher o posto e a vista no tirar ao natural”: “O meio é muito austero e grave e muito saído para fora, e não mostra nada da fronte nem de diante, mas somente o rigor do perfil”.


Quando criar dói
2007


Porém, o que me incomoda nesta obra são algumas “alegorias” (não sei se esse será o melhor termo para designá-las) pinçadas para demonstrar, representar, esse sofrimento do criador. Essa própria associação, que parece ser (re)utilizada ad eternum no que diz respeito à produção de curtas-metragens no Brasil (em especial universitários) entre processo de criação e momentos de introspecção, que dialoga claramente com patologias como a depressão, um tanto quanto me cansa. Criação é igual à depressão? Criação é igual à introspecção?


Ao infinito
2007


Conversando com um amigo sobre esta experiência de escrever críticas para o festival, este me enviou via e-mail um trecho de um certo autor (cujo nome ainda não sei), versando sobre a experiência da crítica de cinema. Ele diz: "... os criticos de hoje perderam a capacidade de se espantarem com os filmes, de não saberem o que dizer. Enquanto o critico não se der a possibilidade de ver algo além dos seus sentidos, não haverá crítica". Faço dessas palavras as minhas no que diz respeito a essa sensação de "não saber o que dizer" sobre um outro curta presente na Competição Nacional 6, "Convite para jantar com o camarada Stalin".


Folhas secas
2007


É muito bom quando vamos a um festival de cinema, especialmente nos de curtas, e percebemos que os programadores realmente estavam preocupados em criar sessões com obras que dialogam, seja direta ou indiretamente. Esse tem sido o caso da Curta Cinema deste ano. Fiquei buscando apelidos carinhosos para o programa 4 da competição nacional. Pensei em “Capitão Planeta”, “Floresta amazônica”, dentre outros...


Retratistas e retratados
2007


"Câmara viajante” faz metalinguagem. Partindo do princípio de que este curta é sobre a relação entre fotografia e retrato e que é um documentário, temos um retrato em movimento sobre retratos estáticos. O diretor Joe Pimentel constrói sua obra a partir de um fluxo de belas imagens de seus cinco personagens principais em processo de captura de imagens, mesclando as mesmas com depoimentos dos mais interessantes sobre o melancólico ato de se eternizar a imagem do outro.


Um homem entre linguagens
2007


Em seu “As maletas de Tulse Luper”, por exemplo, Peter vem disponibilizando via Internet parte dos conteúdos que permeariam estas caixas de estranhezas de seu personagem principal, além de articular sua obra a uma série de CD-Roms e DVDs. Em outras obras, como “O cozinheiro, o ladrão, sua mulher e o amante” e “A última tempestade”, o auxílio de computação gráfica e de uma potente e arrojada direção de arte contribuem gravemente com a qualidade e poesia das imagens apresentadas.


Estesia
2007


O que é dar o fatídico primeiro beijo? Perguntemos melhor: como é dar o primeiro beijo, segundo Esmir Filho? Parece difícil não ter em mente alguns de seus outros filmes, que apontam para tantas direções, tais como uma homenagem ao teatro (“Ato 2 Cena 5”) ou a pretensão de criar um universo de fábula (“Ímpar Par”). Podemos continuar nessa certa “tradição numérica” em Esmir Filho e, dessa vez, pensarmos sua relação para com os pontapés iniciais. O beijo aqui é um estudo de caso.


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